Paulo Navarro | segunda, 6 de março de 2023

Entrevista com a escritora Blima Bracher. Foto: Ricardo Correia de Araújo

Olhe Bem as Montanhas

O olhar e os olhos já renderam bons títulos de livros e filmes como janela indiscreta, por trás dos seus olhos, de olhos bem fechados, olhos famintos, olhos de gato, o pálido olho azul. Agora, a coleção ganha um novo exemplar, “Estrábica” da inquieta e múltipla Blima Bracher que, sem abandonar sua Juiz de Fora natal, ganhou Ouro Preto e o mundo que vê. A começar pelas montanhas. E em Minas, tem binóculo melhor, para olhar as montanhas, que as lentes de uma estrábica? Elas, as montanhas, estão por todos os lados. Claro, isso, enquanto as mineradoras não as transformarem em pó ou lama. O programa “Word” do computador não reconheceu e grifou o nome Blima, em vermelho, como naquela música, “Olhos Vermelhos”, do Capital Inicial. Mas não grifará mais, pois Blima acaba de ser “adicionada ao dicionário”. Esperamos que vocês façam o mesmo, principalmente com as palavras mais estrábicas do livro. Vocês verão o mundo com outros olhos: alegres, vanguardistas, intensos, engraçados, mas também sombrios, coloridos, brilhantes.

Blima, para quem ainda não sabe, de onde vem tão original e lindo nome? 

Meu nome é hebraico. Significa "Ela Brilha". Meu pai fez uma homenagem a um amigo judeu que o ajudou muito no início da carreira. Este homem também era pai de uma Blima. Mas nós não somos judeus.

Trocou os “vídeos e filmes” pela literatura ou completou-os?

Na verdade nunca abandonei o jornalismo, no sentido de sempre registrar tudo que vejo. Tornei-me mais seletiva e digo que, trabalhando no Ateliê Casa Bracher, "não posso estar diante de tanta beleza sem registrar". Assim vieram os filmes e documentários.

Qual foi o primeiro?

Comecei com "Âncoras aos Céus", em Brasília. Fiz "Pintura & Permanência". Viajei para a Europa com papai numa retrospectiva dele e tenho fotos belíssimas que viraram livros e catálogos.

Foto: Ricardo Correia de Araújo

Daí, o Ateliê Casa Bracher?

Somos uma empresa familiar e eu sou "os olhos do rei", apesar de estrábica. Também fiz filmes com minha mãe. "A casa verde de todas as cores" concorre ao CINEOP deste ano. E tenho o blog blimabracher.uai.com.br

E os textos, crônicas, roteiros, “inéditos e dispersos”?

As crônicas vieram como grata surpresa. E algumas eu transformei em curtas-metragens, como "Você se alimenta da minha angústia" e "Queria todas as mulheres em mim". Meus filmes estão todos no YouTube.

Agora, o primeiro livro. Mesmo com tantos prêmios?

Sim. Desde criança flertei com a literatura e ganhei prêmios infantis e adolescentes. Dois internacionais: do Vaticano e do Rotary Club. Mas depois de adulta o dom secou. Foi só depois que tive uma forte dor na coluna, que se liga, diretamente, aos nervos que, numa madrugada lancinante de dor, me levantei e escrevi três crônicas. 

Da dor, os “analgésicos”?

Depois disso, elas vinham e me solicitavam, mais amiúde. Ganhei o Prêmio Sesc de Literatura, na categoria "Crônicas Rubem Braga"; outro da Academia Juizforana de Letras e um terceiro, da Revista Píncaro de Literatura. Também fui selecionada no "Pena de Ouro" para países de língua portuguesa.

Por que “Estrábica”? Você é?

Desde bebê. Não só estrábica. Tenho hipermetropia e astigmatismo. Uso nove graus na vista.

Canhota ou destra?

Destra e canhota para manusear o garfo.

Beatles ou Stones?

Sou rebelde por natureza. Portanto, uma eterna pedra rolante. Mas Beatles, como música, não tem igual.

Como uma estrábica vê o mundo?

Literalmente, tudo se converge numa imagem com sombras coloridas sobrepostas, como auras. Mas de forma geral, quem enxerga menos é mais sensorial. Tenho audição, paladar e olfato apurados... E tenho memórias que são sensações. 

Outra “inspiradora dor”?

Isso ajuda na escrita, descrever emoções e sentimentos que vivi de modo etéreo, sendo bem concreta com as palavras. Escrever, para uma estrábica, é uma forma de ancorar sensações e energias no tempo e espaço.

Como a Blima vê a vida? 

Sou alegre, vanguardista, intensa e engraçada. 

Foto: Ricardo Correia de Araújo

No teu livro tem o quê? “Comida, diversão e arte”?

Memórias, viagens, amores e lembranças do ateliê de papai.

Tem Juiz de Fora, Ouro Preto e BH?

Todos essas cidades, além de Europa, Piauí, Salvador, Buenos Aires, São Paulo, Rio e o coração de algumas pessoas.

Tem muitas viagens?

Físicas e intangíveis. Memórias imaginárias daquilo que não vivi, ou vivi remotamente, me perseguem. Será um mal dos escritores?

Tem Fani e Carlos Bracher?

Tem não só nas letras, como as vinhetas são de minha mãe e as ilustrações de papai. 

Já se arriscou na pintura? Ou já cometeu alguma? 

Sim. Sou boa em retratos, segundo meu pai. Quando criança, fiz alguns. Gosto de rostos, personas, personagens. Por isso escrevo. Escrever é desenhar pessoas. Quem sabe, um dia, venham os pincéis?

E as ilustrações em “Estrábica”?

As ilustrações são um presente. Eu amo me transformar em vários personagens. Fico loira, morena, faço caras e bocas e me fotografo assim. São selfies de "Blimas" possíveis. Um dia pedi ao meu pai que ele interferisse nestas fotos e elas viraram as ilustrações do livro. Como se fossem crônicas de mim mesma, com as cores e movimentos do Carlinhos.

Hora dos nossos comerciais. Como adquirir o livro antes dos lançamentos?

Comercialização do livro impresso: Site da Viseu (editoraviseu.com), Amazon, Americanas, Magazine Luiza, Shoptime e Submarino. Comercialização do e-book: Amazon, Apple, Barnes & Noble (EUA), Google, Kobo, Livraria Cultura e Wook (Portugal). Link direto: https://www.editoraviseu.com.br/estra-bica-prod.html

Para terminar, a “gaveta” continua cheia de crônicas? 

A gaveta é minha cabeça.