Paulo Navarro | segunda, 23 de janeiro de 2023

Entrevista com a idealizadora da Mostra de Cinema de Tiradentes, Raquel Hallak. Foto: Leo Lara.

A Rosa Púrpura de Tiradentes

O Cinema é a Sétima Arte porque reúne, numa tela, a magia, luz, emoção e criação das outras artes? Talvez! Com certeza! Na entrevista de hoje, com a “diretora” e idealizadora da Mostra de Cinema de Tiradentes, Raquel Hallak, outras armas do “escurinho do cinema”. Palco de infância feliz, descobertas e beijos roubados, à maneira de François Truffaut. Vitrine da saudade, da paixão e da indústria. Ferramenta poderosa de “desenvolvimento humano, econômico e de transformação social; construção da cidadania”. Sim, nós já vimos este filme, mas, como numa sessão da tarde ou num “Corujão”, vale a pena ver de novo. O cinema é um sonho e sonhos, como vocês sabem, não envelhecem e ainda ganham muitas retrospectivas. Então, até dia 28, desliguem os celulares, acendam as pipocas e bons filmes. The End!

Raquel, o cinema é uma paixão desde quando? 

Como entretenimento, desde os tempos de menina, em que ir ao cinema era o melhor e quase único programa de cidade do interior. Ir ao Cine Glória, na minha cidade natal, São João Del Rei, era uma diversão ímpar, além de ser um programa para namorar. Quem não se lembra de um beijo na boca no escurinho do cinema? Que saudade! 

E como trabalho?

Como indústria, a paixão começa com a Mostra de Cinema de Tiradentes (1998) - porque representou uma descoberta. Constatei o quanto o audiovisual é poderoso. Uma paixão; divertir e trabalhar com cinema.

Qual teu cineasta favorito? E o filme predileto? 

São muitos. Destaco o cineasta do Distrito Federal, Adirley Queirós e seu filme "Branco Sai, Preto Fica", pela genialidade da criação, na inovação da linguagem, na estética e história contada.

Como foi idealizada e viabilizada a Mostra de Cinema de Tiradentes? 

Nasceu para ser a grande aliada do cinema brasileiro, todo janeiro, desde 1998. Consolidou-se como o maior evento dedicado ao cinema brasileiro em formação, reflexão, exibição e difusão. Traz o que há de mais inovador e promissor. Programação abrangente e gratuita. Tem o patrocínio de empresas comprometidas com a cultura em Minas e no Brasil, através das Leis de Incentivo à Cultura e também com a participação de empresas parceiras e apoiadores.

A Mostra é a ou uma das joias da Coroa, em Tiradentes? 

É o evento precursor da descoberta da vocação turística de Tiradentes. O evento que projetou Tiradentes mundo afora, atraiu investimentos, estabeleceu compromisso e parcerias para instalação de um cinema na cidade, criou vínculos sociais e educacionais com as comunidades e a cidade. 

E para o respeitável público?

Contribuiu para a formação de uma geração de jovens, para o desenvolvimento social, humano e econômico. Referência para que novas iniciativas e eventos acontecessem na cidade. É o evento de maior pertencimento pelo público.

Como ela colabora para o Turismo, logo, com a Economia da cidade? 

Da cidade, da região, de Minas e do Brasil. São contratadas mais de 250 empresas para prestação de serviços. São gerados mais de dois mil empregos diretos e indiretos. Ela atrai um fluxo turístico cinco vezes maior que a população da cidade, movimentando, com isso, a economia, a geração de empregos, distribuição de renda, ampliando a arrecadação de tributos com efeitos multiplicadores na economia local e regional. É economia criativa e um exemplo bem-sucedido da conexão entre cultura, turismo e educação.

A Mostra foi suspensa durante a pandemia? A crise é um filme do passado, sem ser um clássico? 

Enfrentou o cenário pandêmico com ousadia. Adaptamos nosso modelo muito rapidamente. Durante duas edições – 2021 e 2022 – reinventou sua maneira de ser e existir transferindo para o formato “online” toda sua programação.

Balanço mais que positivo e surpreendente, então.

O resultado, o alcance e a participação do público foram surpreendentes. A Mostra registrou em sua primeira edição “online” mais 550 mil acessos vindos de mais de 100 países, registrou alcance superior a sete milhões nas redes sociais. Foi preciso nos adaptar aos novos arranjos profissionais e artísticos, tendo em vista uma realidade econômica, criativa e complexa.

Agora, volta por cima e ao “normal” do presencial?

Retomamos o presencial e vamos levar para a praça, para a tenda, para o teatro, o cinema brasileiro num cenário cinematográfico que é Tiradentes. Uma programação abrangente, intensa e gratuita. 

O “online” ficou em algum lugar do passado?

Ficou no formato híbrido - “online” e presencial. O que poderia representar crise tornou-se solução amplificada, pois crescemos em alcance, repercussão e benefício para o público. 

Quais são as novidades desta edição? 

Nove dias, com 134 filmes (38 longas, três médias e 93 curtas) de 19 estados - em 57 sessões de pré-estreias e mostras temáticas em três cinemas. Na abertura, homenagem a dupla de cineastas Ary Rosa e Glenda Nicácio. Mais, a performance audiovisual apresenta a temática "Cinema Mutirão" e o 26o Seminário do Cinema Brasileiro traz mais de 150 profissionais em 40 encontros e debates.

A mostra está maior que um filme longa metragem, parece uma série...

Numa iniciativa inédita promove o 1o Fórum de Tiradentes - Encontros pelo Audiovisual Brasileiro, de hoje ao dia 25, com a participação de mais de 50 profissionais. O Programa de Formação, com 12 modalidades - nove oficinas, um laboratório de documentário e três masterclasses em 445 vagas. Para o público infanto-juvenil, tem Mostrinha de Cinema e Mostra Jovem; exposições, performances, shows e arte por toda parte.

E “online”?

Pela plataforma mostratiradentes.com.br, 40 filmes da programação; os debates, abertura e encerramento, com acesso gratuito, de qualquer lugar do mundo. 

Qual o grande segredo da Mostra? Acontecer e agitar janeiro? 

Comemorando 26 anos, a Mostra de Cinema de Tiradentes consolidou-se como o maior evento do cinema brasileiro. Um trabalho coletivo, atento às mudanças do audiovisual. Um ambiente de encontros, de gestação de parcerias profissionais, de inovação e tendências, de interação crítica no cinema do Brasil.

Um balanço final...

Apresentou uma nova configuração de cinema, abriu espaço para propostas de estéticas; linguagens ousadas e independentes. Revelou novas iniciativas, colocando em evidência as características e novidades do cinema brasileiro. Inaugurou o diálogo entre críticos, pesquisadores, realizadores e produtores. Investiu no potencial dos jovens com ações de formação e reflexão. A resposta e a participação do público fizeram toda diferença. 

O foco já está em 2024? 

Nosso foco está em 2023 que só está começando. Estamos abrindo o calendário audiovisual brasileiro num cenário que pode representar um novo ciclo para o setor cultural no Brasil. Temos muito trabalho pela frente e esperamos que a Cultura assuma seu papel central como área fundamental de apoio e estímulo à diversidade de manifestações do povo brasileiro. A cultura é estratégica e fundamental para o desenvolvimento de uma nação. Então, mãos à obra!