Paulo Navarro | segunda, 20 de fevereiro de 2023

Entrevista com a especialista em Ética e Compliance na saúde Thais Profeta. Foto: arquivo pessoal

Profecia Concretizada

Thais Profeta é especialista em Ética e Compliance na saúde. Bela palavra, mas não é apenas mais um estrangeirismo como este oceano nada pacífico que invadiu nossas praias. O que é Compliance? Para isso, por favor, leiam a ótima entrevista. Thaís fala sobre a função do Compliance, os marcos no Brasil e os desafios de estabelecer a prática em uma instituição de saúde. Esperemos, para seu próprio bem, que ela continue na área da Saúde, porque, hoje, no “Brasil brasileiro”, tratar de ética, falar de leis do Colarinho Branco, contra a Ordem Tributária, Econômica, de Improbidade Administrativa, de Combate aos Crimes de Lavagem de Dinheiro e Anticorrupção, é como falar de corda, na casa de Tiradentes. No mais, boa sorte e que venham os desafios de 2023, 24, 25, 26...

O que você fez, exatamente, no meio de uma pandemia?

Tive a honra de implementar a área de Compliance e Privacidade de Dados (LGPD) em uma grande instituição de saúde no Vale do Aço, dando apoio à sua governança, visando uma maior transparência e integridade nas relações.

Afinal, o que é Compliance?

Compliance é uma palavra em inglês que tem origem do verbo “to comply”, que quer dizer estar em conformidade (de acordo). No âmbito empresarial é estar em conformidade com a boa fé, com o conjunto de valores éticos e de integridade da instituição.

E em “português”?

Na prática, o Compliance tem a função de proporcionar maior transparência, segurança, apoio na minimização de riscos de integridade, principalmente os riscos de fraude e corrupção, de conflito de interesses, de conduta antiética, orientando sobre a necessidade de cumprimento das leis e demais regulamentações, bem como do Código de Ética e Conduta, políticas e demais regras internas.

Tarefa de Hércules!

O Compliance também traz como reflexão a necessidade de se pensar como seria nosso comportamento sem que ninguém estivesse olhando. Por isso, é importante que se faça essa reflexão. Em outras palavras, criamos o slogan “fazer o certo faz bem!”.

Quais os marcos do Compliance no Brasil?

O próprio conceito já era utilizado em algumas empresas públicas e privadas desde os anos 90. No Código Penal, destacam-se as Leis do Colarinho Branco, a Lei dos crimes contra a Ordem Tributária, Econômica e Contra as Relações de Consumo, a Lei de Improbidade Administrativa de 1992, Lei de Licitações e Contratos Administrativos, Lei de Combate aos Crimes de Lavagem de Dinheiro, Lei nº 9.613/1998, dentre outras leis e decretos.

Alguém já disse que o problema do Brasil é ter leis demais...

Contudo, foi a publicação da Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013), que trouxe um fio de esperança e popularizou o Compliance no Brasil, uma vez que definiu regras que fortaleceram ainda mais o Compliance no Brasil. Os Decretos Nº 8.420/15 e Nº 11.129/22 que vieram regulamentar essa Lei, determinam as bases para a criação dos programas de integridade nas empresas.

Qual a importância do Compliance para uma instituição?

O Compliance assume características imprescindíveis para uma instituição como transparência, governança, mitigação de riscos e sustentabilidade. Por exemplo, a normatização quanto ao recebimento de brindes, presentes, eventos e entretenimento. Diretrizes para o relacionamento com o poder público. Entre outros

O que é preciso para implantar uma estrutura de Compliance em uma empresa?

Acredito em quatro pilares extremamente importantes. O primeiro é a governança, que podemos definir como o comprometimento da alta administração, incluídos os conselhos, evidenciado pelo apoio visível e inequívoco ao programa (Decreto). O segundo, pessoas certas nos lugares certos. O terceiro é referente ao orçamento, ou seja, a destinação de recursos adequados para realização e manutenção do programa de integridade e da área, como headcount, infraestrutura, equipamentos, sistemas de TI, consultorias, viagens, treinamentos etc.

E o quarto pilar?

Por último e não menos importante, os processos. A definição dos processos ligados ao Compliance e os processos a serem definidos pelo Compliance são muito importantes.

Conte um pouco da sua experiência de implantação do Compliance em uma instituição de saúde.

A área da Saúde é bastante específica e o primeiro grande desafio foi conhecer os negócios da instituição e a natureza jurídica da mesma. Segundo, o de implementar as adequações necessárias para a nova Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Em tempos de pandemia, atuamos em home office por quase dois anos, implementando uma nova área, montando e treinando equipe e colaboradores. Em 2020, estruturamos a área, equipe e iniciamos os trabalhos de Compliance e LGPD, definindo uma DPO – Encarregado de Dados Pessoais. Em 2021, contratamos um canal de ética independente e, em agosto do mesmo ano, lançamos o Programa de Integridade e o novo Código de Ética e Conduta revisado, com a presença de Conselheiros e Diretores.

Bom, tudo isso passou. E agora? Férias? 

Sim, férias merecidas para toda equipe. Mas o desafio agora é fazer o Programa de Integridade rodar com os pilares de prevenção, detecção e resposta.

Compliance é uma tendência definitiva e veio para ficar? 

Com certeza, principalmente hoje, com a consolidação do tema de ESG nas organizações, que as instituições estão, a cada dia, mais preocupadas em adotar posturas éticas.

O que falta para isso? Mais divulgação? 

Acredito que falta priorização das empresas.

E em teus planos para 2023, onde pretende aplicar o Compliance ou vai partir para outras e outros? 

O Compliance se inicia nas pequenas atitudes do dia a dia. E que venham os desafios de 2023.