Paulo Navarro | segunda, 16 de janeiro de 2023

Entrevista com o superintendente-geral do Hospital São Francisco, Helder Yankous. Foto: arquivo pessoal

Franciscano Helder

Impossível não associar São Francisco de Assis, o santo, ao Hospital São Francisco, em Belo Horizonte. São Francisco viveu para os pobres, o hospital é um oásis no SUS. Ou era! Como sempre, a Saúde, para quem mais precisa, está sempre correndo risco de morte, está sempre no CTI. Impossível, até mesmo em sonho, saber quando esta chaga será tratada e muito menos curada. Daí, a importância da entrevista de hoje, com Dr. Helder Yankous, superintendente-geral da instituição. Depois da devida apresentação, Helder explica o que está acontecendo, o que pode acontecer e o que pode ser feito para salvar esta referência em Saúde no Brasil. Devemos cobrar e contar, não somente com os níveis municipal, estadual e federal, mas também com qualquer pessoa, física ou jurídica. Para terminar, um lembrete, quase uma “chantagem emocional”: quem dá aos pobres, empresta a...

Helder, primeiro, uma curiosidade normal aqui. Teu sobrenome. É originário de onde?

Meu sobrenome tem origem grega, mas chegou até aqui pela França, um grego casou-se com uma austríaca e os dois foram para França onde tiveram filhos, um deles, meu bisavô veio para o Brasil, meu avô é a primeira geração aqui.

Por favor, apresente-se às leitoras e leitores.

Casado, pai de três filhos. Mineiro de Bom Sucesso; formei-me em Medicina na faculdade de Barbacena e atuei, por muitos anos, como ginecologista obstetra, posteriormente me especializando em Gestão em Saúde, onde atuo há mais de 17 anos.

O que representa o Hospital São Francisco?

A instituição, que atende 100% SUS, tornou-se uma Fundação e, assim, administra três unidades, nos bairros Concórdia e Santa Lúcia em BH e uma em Contagem. Atualmente, atende a mais de 500 municípios em especialidades de média e alta complexidade. Mantém 397 leitos de internação, sendo 70 leitos de CTI e mais de 1.700 colaboradores, que prestam serviços hospitalares e cirúrgicos de alta, média e baixa complexidade em 34 especialidades. 

E antes?

Somente em 2021, foram realizadas 9.319 cirurgias, 12.846 internações, 29.109 sessões de hemodiálise, 36.636 consultas, dentre outros milhares de procedimentos médicos. A instituição é, ainda, referência no Estado em Ortopedia, com mais de 3,5 mil procedimentos realizados.

O que está acontecendo com o Hospital São Francisco?

A Fundação Hospitalar São Francisco de Assis, segunda maior instituição filantrópica, 100% SUS, da capital, enfrenta delicada situação financeira. O Hospital acumula déficits mensais, pondo em risco, uma de suas unidades, a do bairro Santa Lúcia, responsável pelo maior serviço de Ortopedia do Estado.

350 Demissões e morte anunciada?

Após muito esforço, e alguma movimentação das Secretarias de Saúde Municipal e Estadual; além de apoio de parlamentares e algumas Instituições, conseguimos suspender os avisos prévios que foram dados a todos os colaboradores da Unidade Santa Lúcia. Ganhamos tempo para as negociações e a busca de outros caminhos de incremento de recursos para a Fundação, mas, se não houver uma solução em três meses, o fechamento da Unidade Santa Lúcia será inevitável.

Por que faltam recursos para o hospital? Quem é ou são os responsáveis por ele? Por que tanto prejuízo?

A insuficiência do financiamento dos Hospitais Filantrópicos é histórica, ainda mais para aqueles que são 100% SUS como o São Francisco, mas a falta de reajustes regulares nos contratos (o setor vive uma aberração de não ter cláusula de reajuste nestes contratos) associada à alta criminosa nos valores de insumos no período da pandemia da Covid-19, que não retornaram aos patamares anteriores, levaram o hospital (o primeiro filantrópico a ir para a linha de frente do combate e atendimento aos pacientes contaminados) a ter este déficit enorme no seu resultado.

O que tem sido feito para enfrentar esta situação?

A FHSFA tem feito tentativas de renegociação para aumento dos repasses, há mais de um ano, com a demonstração dos prejuízos mensais. Os estudos de viabilidade indicam que, se não houver a cobertura total do valor necessário, a desativação da Unidade Santa Lúcia, com a transferência de alguns leitos para a Unidade Concórdia, diminuirá a necessidade do reforço de orçamento e chegará a um patamar aceitável para melhor equilíbrio das contas e sobrevivência de toda a Fundação. 

Uma luz, então!

Porém, para os Conselhos e as Superintendências da instituição, a primeira escolha e todos os esforços são para a manutenção de todas as suas unidades sem a necessidade de fechamento dos leitos, mas neste momento não depende só de sua gestão. Este ato, que provoca a diminuição de postos de trabalhos e, consequentemente, de assistência à população é algo que muito entristece a FHSFA. Entretanto, se não houver aumento dos recursos ou esta atitude para a otimização da operação, o prejuízo poderá ser muito maior e ter impacto em toda instituição.

O que pode e deve ser feito para reverter esta triste e absurda situação?

É imperativo que haja a recomposição financeira para suprir esse prejuízo, para isso teremos que contar com os níveis municipal, estadual e federal e isso não vai acontecer se não houver uma atuação política forte e também da sociedade, reconhecendo que o fechamento ou diminuição dos atendimentos do maior serviço de Ortopedia de Minas Gerais (que entre 2017 e 2019 era o maior do Brasil em produção SUS) será um prejuízo enorme para os pacientes que dependem do SUS em Belo Horizonte e em todo Estado.

Isso é um retrato da Saúde em Minas ou o que a espera em 2023 e depois?

Com certeza é um retrato do cenário atual no Estado, entre os Hospitais Filantrópicos que atendem mais de 50% dos pacientes do SUS. Como procuro ser sempre otimista, acredito que alguma coisa será feita para o setor sobreviver e recuperar sua capacidade de atendimento. Mas, se nada for feito, com certeza teremos muitas pessoas desassistidas e outros hospitais fechando.