Paulo Navarro | Entrevista com Vinícios Leoncio


Entrevista com Vinícios Leoncio. Foto: Arquivo Pessoal

Ardente Paciência

Só quem tem mais de 60 anos conhece a primeira versão da novela, “Escrava Isaura” (1976) que, nos dias de hoje, certamente ganharia o título de “Escravizada Isaura”. O que reviraria no túmulo o autor do livro homônimo (1875), Bernardo Guimarães (1825-1884). A novela foi sucesso em todo o Brasil e até em países como a antiga União Soviética, Cuba e China, onde a atriz principal, Lucélia Santos virou ídolo. “Escrava Isaura” também tinha um dos maiores vilões da TV, o personagem de Rubens De Falco, “Leôncio Almeida”. Nosso entrevistado de hoje, outro Leoncio, sem acento, é o contrário absoluto do malvado Leôncio da novela.

O advogado tributarista, Vinícios Leoncio é um poço de generosidade, gentileza, humanismo e resiliência. Culto e inteligente, sua vida daria outra novela. Foi menino de rua em BH e garimpeiro em Serra Pelada. Hoje, além da advocacia, está à frente do paradisíaco Hotel Fazenda Paciência, nos arrabaldes da pequena e encantadora Santana dos Montes. O hotel fazenda, que não recebe hóspedes, mas pessoas é, nas palavras de Leoncio, sinônimo de paz, alegria, energia e felicidade. Verdade! Descubram mais sobre o personagem e seu éden, lendo a entrevista com moderada cachacinha e uma moda de viola.

Nem vão precisar de paciência! 

Vinícios Leoncio, sem acento no Leoncio mesmo?

Sim

Você é dono de muita história, mas comecemos com a palavra “paciência”. O que significa para você? Tem alguma definição dela? Santa?

“A ciência da Paz”. É um lugar do bem e da tranquilidade. Às vezes me perguntam se a Paciência é lucrativa e eu respondo: ela me traz paz, alegria, energia, felicidade e ainda precisa dar lucro?

Na esteira, por que teu hotel fazenda também leva o nome de Paciência?

Ao que tudo indica, foi uma homenagem aos Povos Originários Carijós, habilitantes da região, que por serem extremamente dóceis e calmos, recebeu o nome de Fazenda da Paciência.

Brevemente, se possível, qual a secular história da fazenda?

Construída em 1742, restaurada a partir de 2001, testemunhou eventos importantíssimos na história do Brasil: a extração de ouro, a Inconfidência Mineira, a Independência, a Lei Áurea, Proclamação (golpe) da República, dentre tantos outros. A fazenda tem uma enorme galeria, encravada no Pico da Paciência, 1210 metros de altitude, que embora ainda não comprovada, nos parece ser um esconderijo destinado a abrigar os inconfidentes.

Nós já conhecemos, adoramos e queremos voltar. Para quem ainda não conhece, o que o Hotel Fazenda Paciência tem e oferece?

Uma experiência cultural diferenciada. Recentemente inauguramos o Museu de Ofícios Rurais da América Latina MORAL. São 300 peças dos mais variados países que retratam o homem em seu estado bruto na natureza. Além disso, claro, o Brasil está lá representado por inúmeras peças. Não recebemos hóspedes e sim pessoas.

Qual o papel, o lugar dos hotéis fazenda, no Turismo em Minas?

Minas Gerais é o estado que lidera a procura pelo Turismo Rural no Brasil. A busca por tranquilidade, a comida como fonte de resgate das origens, a memória afetiva efervescente e efervescendo, o desejo de afastar os filhos dos celulares sempre à espreita e, claro, uma boa música caipira, daquela que ouvimos, temos saudade, mas não sabemos de quê. Portanto, a relevância dos Hotéis Fazenda em Minas Gerais ocupa um lugar de destaque e de relevância.

Você adora História! História, em Minas, também é Turismo?

Minas Gerais é para mim, o estado com o maior acervo cultural do Brasil, capitaneando os acontecimentos políticos e econômicos do Brasil com o exterior. O Turismo Cultural é um ponto que Minas precisa dar um foco mais relevante, pois temos muito a oferecer para o mundo.

Tua preferência e homenagens são para a Inconfidência Mineira?

Sou fascinado pela Inconfidência, mais precisamente por Tiradentes. Contrariando alguns historiadores, que o veem como um “bobo da corte”, eu o vejo como um homem muito além de seu tempo. Um homem que manda a Paris um emissário encontrar-se com o embaixador americano na França, Thomas Jefferson, pleiteando apoio ao movimento da Inconfidência, recebendo dele uma cópia da Declaração de Independência do EUA, não pode ser o “bobo da corte”.

Dia 6 de julho, devidamente caracterizado, você tirou terno, gravata e “intimou” muita gente para a inauguração da Embaixada do Hotel Fazenda Paciência. Como foi o evento?

A Embaixada do Hotel Fazenda Paciência é um espaço destinado justamente para apresentar ao público a História de Minas Gerais, além de proporcionar um elo entre o hotel e o público. Apresentamos, no Mercado de Origem, em Belo Horizonte, magnífica Guarda de Congada, formada por mulheres, já que a Paciência inicia este ano um resgate das grandes mulheres que ficaram à margem da história. Depois, ainda tivemos uma ótima apresentação de Moda de Viola.

E a Embaixada? Isca e anzol para hóspedes e turistas? 

Não diria isca nem anzol, nem o rio enquanto um curso de água, mas a “Terceira Margem do Rio”, de Guimarães Rosa. O Hotel Fazenda Paciência busca proporcionar a terceira margem do rio, ou seja, uma experiência diferente.

O Hotel Fazenda já está 100% pronto ou os trabalhos não têm fim? 

Fazenda é fazer todo dia. O Hotel está pronto e acabado, porém, constantemente estamos buscando elementos que possam proporcionar mais e mais aspectos culturais para as pessoas que vão ao hotel. Lembrando, não recebemos hóspedes e sim pessoas.