Paulo Navarro | Entrevista com Vanessa da Mata


Entrevista com a cantora Vanessa da Mata. Foto: Priscila Prada

Mata Exuberante

A cantora Vanessa da Mata apresenta o show “Vem Doce”, dia 14, às 21h, no Grande Teatro Cemig Palácio das Artes. Vanessa vai provar que, além de grandes cantoras, o Brasil também tem poucas (ainda) compositoras e ela é uma delas. Pouca gente sabe que Vanessa, nascida no Mato Grosso, tem fortes ligações com Minas. Passou parte da juventude em Uberlândia, conhecendo de perto o acolhimento e o afeto dos mineiros; tem eterna gratidão e admiração pelo gênio de Milton Nascimento, “um dos poucos que me fazem sonhar de uma maneira num lugar sagrado” e, além dos sucessos, promete surpresas para quem for ao Palácio das Artes.

O que não é surpresa, o que o Brasil conhece, “de cor e salto alto”, é seu amor pela música. Música que veio de “caminhoneiros, dos discos de vinil, da família e da avó benzedeira”. E a benção que deu certo, “fazendo da música um elemento vivo que cresce e se renova a cada encontro de gerações”. Incluindo, claro, a nova leva de cantoras. Com muita energia, Vanessa convida: “Passarinhos belo-horizontinos, venham ver um espetáculo que une elementos de grandes gêneros da música e da cultura brasileira”. Encontro marcado!

Vanessa, tua carreira chega aos 20 anos, marcada, principalmente, pela mistura de ritmos brasileiros. O fato de ter nascido no interior do Mato Grosso teve impacto para esta junção tão fértil de influências em sua formação? 

O principal fato foi ter vindo de uma família de caminhoneiros que iam e vinham trazendo discos de vinil, pessoas interessadas em música. Uma família preta maravilhosa. Uma avó benzedeira interessada em música, cuja Folia de Reis se passava principalmente na casa dela, era a primeira a comemorar a folia. Essa celebração, com a música foi o principal fator de eu ficar imersa nisso e de aprender com eles.

Pouca gente sabe que você viveu, durante parte de sua juventude, em Uberlândia, no Triângulo Mineiro. Quais as primeiras impressões de Minas Gerais e do povo mineiro? 

As melhores possíveis. Senti o acolhimento e afeto tão bem falado dos mineiros.

Além dos 20 anos de carreira, completamos este ano 15 anos do álbum Vanessa da Mata (Multishow ao Vivo). Teremos releituras daquelas canções, tão marcantes no Palácio das Artes?

No meu repertório estão as músicas de “Vem Doce”, mas também passo pelos meus discos mais antigos e os sucessos que se eu não cantar o povo vai reclamar comigo (risos). Sobre surpresas, prefiro deixá-las para o momento do show. Vocês vão ver.

 O Brasil é celeiro interminável de mulheres cantoras e compositoras. Como acompanha a chegada de novas artistas e de cantoras mineiras, como Marina Sena? 

Orgulha-me ver tantas mulheres lindas e talentosas ganhando cada vez mais espaço, tendo seu devido reconhecimento. Eu sou muito atenta às novidades na música de uma maneira geral. E é isso, a música é um elemento vivo que cresce e se renova a cada encontro de gerações. 

Como foi o processo criativo do disco “Vem Doce”, lançado em 2023? Quais estilos são mais explorados no álbum? 

O álbum une elementos de grandes gêneros da música e da cultura brasileira. Possui 13 faixas inéditas e contempla diferentes gêneros e parcerias, como João Gomes, com quem canto "Comentário a Respeito de John", regravação de Belchior, além de Marcelo Camelo, L7NNON e Ana Carolina. Em “Vem Doce” eu quis explorar um lado mais cronista meu. Eu falo de situações cotidianas como em “Vizinha Enjoada” e “A Amiga Fofoqueira”, mas também de assuntos mais sérios como em “Foice” e, claro, de amor também, como em “Vem Doce”, que dá o tom do disco. 

Muito se fala da hegemonização do sertanejo como estilo mais ouvido no Brasil hoje. Como vê o cenário de estilos mais próximos à sua trajetória, como a MPB e o reggae nacional?

Muito se fala na hegemonização do sertanejo porque é verdade mesmo. Existe o fator grana, colocado nesse gênero, que invade todos os lugares e hegemoniza os ouvidos do Brasil. Não tem como negar. O mais terrível é que os outros gêneros saem, conseguem se desenvolver, mas não conseguem se estabelecer no mercado. Porque não existe uma abertura para um mercado maior, para conseguir fazer com que esses gêneros tenham seus clientes, seus ouvidos, seus interesses.

Nestes 20 anos foram diversas apresentações em Belo Horizonte. Algum show, ou alguma parceria, com artistas mineiros ficou na memória? 

Uma das pessoas que me abraçaram no começo de carreira foi Milton Nascimento, cantei muitas vezes com ele. Ele me deu um espaço enorme nos shows dele. Tenho muita gratidão. E Milton é um dos poucos que me fazem sonhar de uma maneira num lugar sagrado. Então pra mim foi um lugar de gratidão mesmo, de descoberta, de aprendizado enorme.

Como encara essa superexposição dos artistas nas redes sociais? Você tem milhões de seguidores. De que forma busca conciliar a publicação de temas profissionais com a sua vida pessoal e até posicionamentos sobre temas, por exemplo, como o que aconteceu, em maio, no Rio Grande do Sul?

Eu demorei um pouco a me colocar de uma maneira confortável, muitas vezes eu não fico confortável diante de tanta exposição. Superexposição, extra-exposição, eu diria. Mas eu tenho uma tendência a me recolher bastante. Essa coisa do que aconteceu no RS, algum outro tema, eu tenho uma tendência, quando é algo desse fator, de que eu chego junto e me responsabilizo por algumas coisas que eu consigo. Outras vezes já não consigo tanto. Por exemplo, eu estou numa superênfase de ensaios sobre Clara Nunes e finais de semana indo com meus shows. Então eu tento o tempo todo entender e deixar espaços para minha posição como criadora também, porque isso eu dependo do meu silêncio, do meu encontro comigo.

Para finalizar, um recado para os belo-horizontinos e um convite para acompanhar o espetáculo “Vem Doce”.

Passarinhos belo-horizontinos, venham ver um espetáculo que une elementos de grandes gêneros da música e da cultura brasileira. Minha energia é a melhor possível e tenho certeza que vamos ter uma noite muito especial. Esse show tem uma beleza muito diferente dos outros. Ele é dividido em três atos, tem uma direção artística maravilhosa do Jorge Farjalla, tem uma consistência, um passeio pela minha criação, pelas minhas crônicas cantadas. 

Mais uma entrega total?

Ele é bem diferente e faz parte da minha história pra quem acompanha, pra quem se diverte, pra quem se entende e se coloca no meu trabalho, se identifica de muitas maneiras. Eu acho imprescindível que ele esteja dentro dos seus passeios musicais pelos shows. Ele me traz uma evidência nas composições, porque muita gente não sabe que sou eu que componho minhas músicas desde o início de carreira. Então sou uma compositora e isso é muito raro aqui no Brasil, são apenas cerca de 5% da composição nacional feita por mulheres.