Paulo Navarro | Entrevista com Rejane Faria
Entrevista com Rejane Faria. Foto: Rafael Freire
Tempo, tempo, tempo
Que coisa irritantemente linda! Ainda ontem era janeiro, 2025 acabava de começar e amanhã já é quase março, daqui a pouco, 2026! A velocidade do tempo consegue assombrar, não uma casa de quatro andares, mas um mundo inteiro. Outro exemplo vem com a pergunta: “Nos dias de hoje, e se fosse possível desacelerar o tempo?”. Esse foi o ponto de partida de “Velocidade”, novo trabalho do Grupo Quatroloscinco Teatro do Comum, que estreou e, em um mês, já partiu do CCBB/BH. A décima montagem da companhia continuou a parceria do cineasta Ricardo Alves Júnior, que assina a quarta direção do grupo, agora, ao lado do ator Ítalo Laureano. No elenco, estava e continua a atriz Rejane Faria, que falou da velocidade do tempo que deveria servir para valorizar o presente e as relações humanas, como uma pausa de uma hora e meia dentro de um teatro.
Rejane recomendou também que o efêmero seja mais palpável. Explicou até o significado de Quatroloscinco! Rejane divagou sobre o presente, seu tempo e confessou que gosta do que vê nele, do quanto é inspirador. Rejane viajou, foi, voltou, fez planos e, mais uma vez, sentiu o tempo acabar aqui para começar com a primeira pergunta a seguir.
Oi e tchau!
Rejane, “Velocidade”, espetáculo ou peça?
Posso dizer que as duas coisas, porque além de entregar uma peça para o público em forma de livro, contém elementos espetaculares: instrumentos, canto, componentes audiovisuais sem recursos de tela ou câmera, e um belo jogo de luz, som e imagens. Para além destes conteúdos, ainda traz para a cena os bonecos do saudoso Agnaldo Pinho que compõem lindamente esse “cenário”.
Passou velozmente por Belo Horizonte. Como foi?
Na verdade, no segundo semestre de 2024, eu estava dedicada às filmagens de “Vicentina Pede Desculpas”, longa de Gabriel Martins, mesmo roteirista e diretor de “Marte Um, filme” indicado como representante internacional ao Oscar 2023. Na sequência e paralelamente fiz as gravações do remake de “Vale Tudo”, me juntei ao Quatroloscinco, meu grupo de teatro que já havia iniciado as pesquisas do novo espetáculo: “Velocidade”. Estreamos dia 2 de janeiro, numa temporada de um mês do CCBB/BH, com casa lotada todos os dias. Um presente que BH nos deu, indo ao teatro nos ajudar a construir mais esse grande momento da carreira do grupo que, esse ano, comemora 17 anos de atuação e pesquisa continuada. Deste modo consegui passar um semestre quase todo por aqui, coisa rara nos últimos tempos.
Por que o interessante nome do grupo, “Quatroloscinco”?
Nós formamos atores profissionais, e o próprio grupo, na UFMG, mas no início desta jornada de um trabalho coletivo, não sabíamos se seríamos quatro ou cinco pessoas, porque alguns desencontros ocorreram em função das atividades acadêmicas. Por fim, fazíamos uma disciplina de teatro latino-americano, que muito nos interessava, pela linguagem e temáticas políticas sociais próximas da nossa realidade. Em meio a tudo isso, a língua espanhola permeava aquele universo e um dia saiu a pergunta: Somos quatro ou cinco? Quatro los cinco? Daí, o nome do grupo.
Rejane Faria. Foto: Rafael Freire
Voltando à “Velocidade”. O que você acha da “efemeridade da vida e a rapidez dos tempos”?
Fico pensando que poderíamos refletir mais sobre essas questões, valorizar mais o presente e as relações humanas. O que de fato torna a vida líquida, a meu ver, são as faltas, as lacunas, as rachaduras das vivências coletivas. Quando eu deixo de observar e me interessar pelo outro, contribuo para todas as mazelas que o mundo experiencia neste exato momento. Se eu considero, de fato, a efemeridade como um escape de tudo que criei até hoje, eu não protejo o tempo. De uma outra forma, ou com um olhar mais atento, podemos nos apropriar do que é real e dele fazer com que o efêmero se torne em alguma medida, mais palpável e a velocidade, das coisas e do tempo, mais bem aproveitada.
É uma “resposta ao tempo”?
É uma maneira de repensar o tempo. São sugestões. Essa rapidez imposta nos dá a sensação de que não conseguimos realizar coisas, e se conseguimos, parece que não aproveitamos delas. E estamos sempre buscando culpados. “Velocidade” permite uma pausa de uma hora e meia dentro de um teatro, para a gente conversar sobre isso, e pensar o quanto e como, cada um de nós está envolvido no andamento da vida.
“A gente mal nasce, começa a morrer”, como diria o poeta?
E isso não tem a ver com as escolhas, é um processo natural. Portanto, mais um motivo para não deixarmos o tempo passar sem ser aproveitado, e isso não tem a ver com velocidade.
É uma preocupação humanamente eterna ou eternamente humana?
Acho que eternamente humana. Quem comanda esse grande barco somos nós.
Como o público reagiu, recebeu?
De uma forma muito séria e emocionada. Ir ao teatro é uma escolha arriscada, depende muito de como você está naquele dia, naquele momento. E quando você vai, e a obra te afeta positivamente, o risco se transforma em outros sentimentos. Assim foi com “Velocidade”.
Como subverter o tempo e a velocidade das coisas a partir da arte?
Criando e convidando as pessoas a embarcarem nessa criação artística junto com você. A arte tem o poder de agregar, de construir momentos particulares na vida das pessoas, seja pela fruição ou mesmo pela criação de algo. E todo tipo de arte te permite acessar um outro tempo para as coisas, seja ele durante a feitura, a apreciação ou nos dias que se seguem ao evento. A arte nos permite um tempo parado, vivo e belo. A arte não subverte somente o tempo, a velocidade, mas também os pensamentos.
Em que tempo você gostaria de viver ou ter vivido?
Esse é o meu tempo, gosto do que vejo nele e do quanto me inspira vê-lo com apreço, a fim de promover mudanças, movimentar-me micro politicamente, atentar-me aos acontecimentos mundiais e saber que deles sou parte. E como artista, o quanto me responsabilizo pelo tempo que me é dado de presente.
2025! Mais teatro, cinema, TV ou “Vale Tudo”?
Muita coisa para 2025. São 10 longas para estrear, quatro séries e muito teatro. “Velocidade” segue seu caminho em temporadas no Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília. Faremos também outras peças do repertório do Quatroloscinco. Na sequência, no final de março, “Vale Tudo” “chega com tudo” rsrsrs. E em abril, a tão aguardada série “Pablo e Luizão”, do incrível Paulo Vieira, sobre histórias hilárias de sua família, no Globoplay. Será um ano de muitos novos trabalhos no audiovisual também. Acompanhem no Instagram as novidades.