Paulo Navarro | Entrevista com Lucas Maroca


Entrevista com Lucas Maroca. Fotos: Agência Unick

O Livro no Espelho

Lucas Maroca gosta de livros. Para começar, é corajoso editor. Mas com esta entrevista percebemos que ele vai além. Literalmente, respira livros, talvez desde que sua professora, na infância, indicou o caminho das pedras de papel, mas preciosas: “O livro é a maior invenção da humanidade”. Vejam como Lucas fala de livros: “minha forma de estar no mundo: fazendo livros e promovendo educação e cultura”. Outra? “Sonhamos transformar Belo Horizonte numa cidade referência do livro, bem como uma cidade de leitores!”. Ou ainda: “há uma cultura milenar da importância do livro que nos atravessa e que é passada de geração a geração”. Lucas, ainda bem, prova que não está sozinho.

Muita gente ainda adentra livrarias para cheirar, pegar, sentir, folhear, acariciar, amar este claro objeto do desejo. Afinal, como garantiu Monteiro Lobato, “uma nação se faz com homens e livros”. Deve ser por isso que o Brasil parou no meio do caminho e ainda deu meia-volta “vou ver” no lugar de volver ou “vou ler”. Ah! Boa leitura!

Lucas, de onde vens, onde estás e para onde vais?

Esta pergunta é a mais difícil, me faço todos os dias. Mas vamos lá... Sou de uma família de pais muito sensíveis ao mundo e com experiência em gestão: deste amálgama veio a Crivo. Me formei em Letras (2008) e a Crivo tornou-se minha forma de estar no mundo: fazendo livros e promovendo educação e cultura. Estamos girando a Crivo há 12 anos, hoje uma empresa familiar. E sonhamos, para os próximos 30 anos, com um empreendimento social e coletivo (A Crivo; a Estante Mineira; a Crivo Educa) que possa ser agente real na construção de uma educação de maior qualidade em Belo Horizonte, Minas e Brasil.

E a “Crivo Editorial”?

Um projeto de vida. Uma editora cujo projeto político é tão importante quanto o editorial. Estamos muito atentos para movimentos – desde a publicação de livros até a presença em escolas particulares e públicas – que possam impactar na construção de uma educação de qualidade, almejando mudanças sociais. Eu costumo dizer que não sou um editor de livros, mas de cidades; já que o meu desejo maior é poder participar da coedição desta nossa cidade, Belo Horizonte.

E a “Estante Mineira”? O que é?

A ideia da estante é centralizar, num espaço virtual, as publicações de editoras mineiras, ou seja, uma casa virtual para as casas editoriais de Minas. Naturalmente, este é o ponto de partida do projeto, porque, para além deste marketing place – loja conceito de editoras mineiras – nós estamos muito interessados nos desdobramentos desta união: participação em feiras pelo interior de Minas com as editoras mineiras; presença em escolas com os catálogos das editoras mineiras. Confiantes de que muita coisa próspera para todos surgirá desta reunião.

Estante coletiva e virtual! Fruto da pandemia ou dos novos tempos?

Como se tem dito por aí, a pandemia “acelerou” os novos tempos, fazendo com que o virtual “se tornasse mais e mais real”. A ideia da loja virtual – a loja conceito – facilitou o processo de agregação (reunião) das editoras (por conta dos menores custos). Naturalmente torna possível o acesso de qualquer lugar do país aos acervos. Entendemos, sim, que os “novos tempos” chegaram para ficar: o virtual já é mais do que fato! Mas o plano para a “Estante Mineira” vai muito além da loja virtual; a ideia é que por meio deste coletivo consigamos potencializar o mercado editorial mineiro e, assim, sonhamos transformar Belo Horizonte numa cidade referência do livro, bem como uma cidade de leitores!

E o “Poesia InCrível”? O que é este projeto? Já temos os selecionados?

“Poesia InCrível” é um projeto muito querido, está nos primórdios da Crivo (2014). A gente abre um edital público para seleção e premiação de novos poetas. A primeira temporada, executada em Belo Horizonte, lançou 12 livros (13 novos autores; um livro foi escrito a quatro mãos). A segunda temporada – destinada ao interior de Minas – começou agora, em 2024 e lançará três novos poetas (as cidades contempladas foram Ouro Preto, Mariana e Nova Lima).

Como foi o lançamento de “Menino no Espelho”, clássico de Fernando Sabino, em quadrinhos?

O lançamento oficial foi dia 25 de maio, no FIQ, com a presença dos ilustradores: João Henrique Belo, Clara Pernambuco e Hilton Rocha. Estamos muito orgulhosos deste projeto, pelo seu ineditismo diante de uma obra tão canônica e revisitada pelos leitores brasileiros. Poder transformar o “Menino no Espelho” em 12 quadrinhos, ilustrado por 12 quadrinistas diferentes é um legado que deixamos para o mercado editorial brasileiro.

Voltando à Crivo, sua praia são jovens autores? E os temas?

Brinco que somos alimentados pelo acróstico PIRA (que também significa fogo sagrado). P de Poesia; I de Infantis; R de Rede (autores que chegam com audiências prontas); A de Arte & Cidade (livros que dialogam com a cidade de Belo Horizonte)... Mas, para além destas quatro vocações, temos publicações em outras linhas, sendo uma editora com uma bibliodiversidade significativa.


E os lançamentos internacionais? Como a Crivo trabalha? Conte sobre o escritor português André Letria.

Em 2019, na Feira do Livro Infantil e Juvenil de Bolonha, tivemos a oportunidade de conhecer a coleção “Desconcertinas”, este trabalho tão interessante do André Letria. De lá para cá viemos namorando a possibilidade de fazer uma edição aqui no Brasil. Agora em 2024, recebemos um subsídio da Direção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas DGLAB de Portugal; e vamos lançar a coleção. O André é um nome muito potente da cena mundial do livro. Estamos felizes e honrados por poder lançar um trabalho tão diferente – os livros são sanfonados e com finais sempre muito surpreendentes aqui na Crivo. Estamos na expectativa para ver como será a recepção das pessoas a este livro-objeto.

O livro é o novo samba? Agoniza, mas não morre; balança, mas não cai?

Eu tive uma professora no ensino médio, Maria Helena Tavares Polastri, que me disse uma coisa que nunca esqueci “O livro é a maior invenção da humanidade”. Não tenho dúvida alguma sobre a permanente e veloz mudança dos tempos; está aí escancarado o universo digital que nos rege; mas eu poderia apostar que o livro – entendido como um códice, uma reunião de saber consolidado; como veículo de narrativa e realidade; sempre terá a existência de sua materialidade assegurada.

Em época tão “telefone celular” como as editoras e as livrarias ainda sobrevivem?

Este é um desafio (muito) real, já que a nossa atenção hoje é capturada pelas telas: ela foi deslocada do real para o virtual. Mas o livro persiste! Por mais que a tela “tome conta”, há uma cultura milenar da importância do livro que nos atravessa e que é passada de geração a geração. Um exercício que temos feito é entender o livro como ponto de partida; e aí a gente sai do livro e o coloca no espaço, no ar, nas telas, nos diálogos; objetivamente, na apresentação de uma contadora de histórias, por exemplo.

Quais os próximos planos e projetos?

Estamos empenhados em lançar a “Crivo Educa”: um projeto/aposta da Crivo de levar os livros e os autores para as escolas; isso por acreditar veemente que o livro é o ponto de saída e não da chegada. Começamos muito recentemente com uma embaixadora fazendo este trabalho nas escolas, A ideia é tracionar este movimento.

Recomende alguns livros aos nossos caros leitores e idolatradas leitoras.

“Fósforo Branco”, de Lívia Cristina LC (poesia). “Cosmonauta”, de Mario Alex Rosa, ilustrado por Carol Fernandes (infantil) e “Mulheres Arco-íris”, de Leida Reis (novela).