Paulo Navarro | Entrevista com Cláudia Malta


Entrevista com a diretora artística da Fundação Clóvis Salgado/Palácio das Artes, Cláudia Malta. Foto: Paulo Lacerda

A Diva do Palácio

Todo mundo precisa conhecer Malta, na Europa, um lindo arquipélago no Mediterrâneo, cheio de História e mistérios. Todo mundo deveria conhecer “O Falcão Maltês” (Relíquia Macabra), 1941, obra-prima e primeiro filme de John Huston, que inaugurou o “Cinema Noir”, repleto de suspense, tiros, intrigas e mais mistérios. Todo mundo merece conhecer Cláudia Malta, a incansável, impagável, linda e irrequieta diretora artística da Fundação Clóvis Salgado/Palácio das Artes. Por ela passam todas as artes do Palácio das Artes. Quer dizer, quase todas, certamente as mais mágicas e movimentadas; seus três corpos artísticos, a Orquestra Sinfônica de Minas Gerais, o Coral Lírico de Minas Gerais – completando 45 anos – e a Cia. de Dança do Palácio das Artes, usinas de sonho, poesia e cultura.

Cláudia é um patrimônio do maior complexo cultural do Brasil, onde chegou logo depois de sua inauguração. Sabe tudo porque escalou todos os degraus, com talento, criatividade e amor pelo seu segundo lar ou, em suas palavras, onde toda a arte e a cultura acontecem diariamente. Por falar nisso, o show deve continuar, basta seguirem na leitura.

Continue para ler a entrevista completa!

Cláudia, consegue resumir tua longa trajetória na Fundação Clóvis Salgado/Palácio das Artes?

Cheguei ao Palácio das Artes pouco depois da inauguração, em 1971. Entrei para a escola de Ballet do Professor Carlos Leite, após encerrar minha formação com Ana Lúcia de Carvalho. Em 1973 o professor Carlos Leite escolheu um grupo entre os alunos e fomos contratados, como bailarinos do Corpo de Baile da Fundação Palácio das Artes. Com carteira assinada.

Com carteira assinada. Bravo! Mas...

Pedi demissão em 1978, porque havia passado na audição para bailarinos do Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Fiz nova audição e entrei novamente para o Corpo de Baile em 1981 e fiz parte do elenco até 1985. Quando deixei de dançar.

Mas não de bailar...

Trabalhei na divisão de Cinema, centro de extensão Cultural e fui Superintendente dos Corpos Estáveis, cargo equivalente hoje ao Gerente de Produção Artística, de 1995 até 2005. De 2005 até 2009, trabalhei no Centro Técnico de Produção, como Coordenadora de Produção de cenários e figurinos.

Para, finalmente...

Em 2010 fui nomeada, pela primeira vez, como diretora artística. De 2011 até 2014 fui assessora da Diretoria Artística. Novamente Diretora de 2015 até 2018 e depois em 2019. Retornei à diretoria em julho de 2022.

Apesar da brilhante história, para muita gente, até mesmo os milhares de fãs do Palácio das Artes, você “mora” nos bastidores. Explique o papel fundamental de uma diretora artística.

Todas as produções e eventos dos três corpos artísticos da Orquestra Sinfônica, Coral Lírico e Cia. de Dança são decididas junto à Diretoria Artística, que é responsável pela programação e agenda dos grupos. Decisões como títulos de óperas a serem encenadas, equipe de criação e solistas das produções, parcerias nacionais e internacionais, enfim, o dia a dia dos três grupos passa pela diretoria.

E o papel do Palácio das Artes na Cultura da cidade?

Fundamental, aqui é onde toda a arte e a cultura acontecem diariamente. Entre e veja com os próprios olhos a quantidade de atividades gratuitas que oferecemos todos os dias. E, ainda, as atividades de formação em cinco escolas de arte. Encontros com profissionais dos corpos artísticos, exposições de artes visuais, cinema e muito mais.

Quem é o público fiel do Palácio das Artes?

Hoje este público é bem variado. Encontro pessoas que frequentam o Palácio em todas as atividades que promovemos ou que abrigamos. Gente de todas as idades. Gente que tem bom gosto!

Qual o espetáculo mais memorável, com tua participação, no Palácio das Artes?

São muitos! Cada ópera é uma experiência única, mesmo que o título esteja sendo produzido pela terceira vez. Tenho maravilhosas lembranças do ballet Giselle, onde tive um papel solo. Dançamos com a Orquestra Sinfônica ao vivo, sob regência de Henrique Morelenbaum. O Lago dos Cisnes também foi muito especial, fiz um dos Quatro Pequenos Cisnes, também com a orquestra ao vivo.

Como funciona a delicada e estratégica escolha da programação para que o Palácio das Artes continue sua vocação como um espaço único, diverso e para todos os públicos?

Procuramos agradar a diversos públicos e também a dar desafios para os músicos. Uma boa orquestra e um bom coral têm que estar sempre em cena, tocando e cantando muito e com os mais grandes desafios. Só assim eles crescerão. Fazemos música popular brasileira, fazemos música sinfônica coral, já que temos um dos melhores coros do Brasil. E procuramos principalmente unir os três grupos em um grande espetáculo. Este é o nosso maior trunfo, os três corpos artísticos juntos.

Não esqueçamos os concertos e os outros corpos artísticos. Quais as próximas e imperdíveis atrações, por favor?

Dia 24, quarta-feira, apresentaremos dois grandes pianistas portugueses, Artur Pizarro e Bernardo Santos, tocando pela primeira vez no Brasil o “Concerto para Dois Pianos e Orquestra” de Max Bruch. E a maravilhosa “5ª Sinfonia” de Tchaikovsky. 

Fim de abril, olá maio!

Em maio receberemos o regente alemão, Oliver Weder, para uma noite de sinfonia e óperas. Vamos apresentar o “Requiem” de Verdi, a grande obra sacra, com quatro incríveis solistas, três deles pela primeira vez em Belo Horizonte: Betty Garcés, Enrique Bravo e Anderson Barbosa.

O ano passado, além do “Viva a Ópera”, você e equipe marcaram mais um gol de placa com a ópera “Matraga”. Como foi a ansiedade e depois o sucesso?

“Viva a Ópera” foi uma delícia de espetáculo, porque apresentou os melhores trechos de títulos lindíssimos. Com uma direção cênica que fez uma costura brilhante. E “Matraga” deu trabalho demais! Foram meses de negociação com o escritório que representa os diversos herdeiros. A família dividiu a obra do Guimarães Rosa e cada grupo mantém os direitos sobre sua parte, mas todos participam das negociações. Bem complexo. E tivemos a estreia na Gruta do Maquiné em Codisburgo, terra do Rosa. Foi um acontecimento inédito, muito emocionante fazer música em um lugar como aquele. E o resultado final do espetáculo foi cinematográfico. Um elenco maravilhoso, de atores e cantores, a Cia de Dança brilhando em cena, realmente foi um grande e inesquecível sucesso.

Agora, a grande estrela e estreia deste ano, a ópera “Devoção”. O que é, o que será?

“Devoção” foi encomendada pela FCS para João Guilherme Ripper e André Cardoso. Vai falar da devoção e da fé do povo de Minas Gerais. Inspirada na história de Feliciano Mendes, o português que dedicou sua vida e recursos para a construção do Santuário do Bom Jesus de Matosinhos, onde estão os profetas de Aleijadinho, em Congonhas. Terá todos os ingredientes de uma grande ópera tradicional, com o diálogo entre os ritos formais da igreja e a devoção popular, o sincrético das ruas. 

Quanto tempo de produção? Pode nos adiantar alguma novidade ou prefere guardar as surpresas que encantam?

As conversas se iniciaram há mais de um ano e culminaram com várias reuniões online e diversas visitas à cidade de Congonhas, realizadas pelo compositor, pelo diretor de cena Ronaldo Zero, o figurinista William Rauch e a equipe da FCS. A estreia será lá, ao ar livre, ao entardecer do dia 13 de julho próximo. Tivemos a inestimável ajuda de diversos personagens da cidade, que nos contaram sobre suas vivências durante o Jubileu e contribuíram muito com a elaboração do libreto.

E depois de “Devoção”?

Já estamos trabalhando na reapresentação de “Nabucco”, de Verdi. Ópera que estreamos em 2011 e que agora será refeita. É deslumbrante!

Qual tua ópera favorita?

Todas as óperas de Verdi.

Por fim, faça o convite para os filés da temporada de 2024.

Antes de “Devoção”, em 22 e 23 de junho, vamos estrear um novo espetáculo da Cia. de Dança Palácio das Artes, com direção e coreografia de Henrique Rodovalho. Este promete ser um grande evento. E encerrando o ano “Carmen”, de Bizet. Espetáculo de dança dirigido por Luiz Fernando Bongiovani, com Orquestra Sinfônica, Coral Lírico e Cia de Dança.