Paulo Navarro | Entrevista com Ana Sanches


Entrevista com Ana Sanches. Foto: Jana Vieras

Ana American

Desde dezembro de 2023, a mineradora global Anglo American, que em Minas Gerais possui o empreendimento em minério de ferro Minas-Rio, é comandada pela economista Ana Sanches.

Mineira de Belo Horizonte, a executiva está há 28 anos na estrada profissional, dos quais 12 no setor mineral, defendendo que essa atividade essencial para a nossa sociedade seja feita de maneira responsável, com segurança, inovação e tecnologia.

Saiba mais sobre essa liderança feminina em nosso bate-papo abaixo, que releva a trajetória de Ana Sanches e as perspectivas de futuro dos negócios em mineração.

Ana, primeiro, mil perdões pelas perguntas leigas a uma profissional da área, OK?

Não precisa se desculpar! Durante muito tempo, a indústria mineral se comportou timidamente em sua forma de comunicar. Temos hoje um esforço de todo o setor para se aproximar da sociedade, de forma mais ampla, aberta e transparente. Estamos sempre disponíveis para dialogar com os mais diversos públicos, contar e explicar o que fazemos, escutar as dúvidas e as sugestões.

A você, não falta currículo, pelo contrário, daí uma primeira curiosidade: ao fazer o check-in, num hotel, como preenche o quesito “profissão”?

Eu me reconheço como “economista”. Esta foi minha primeira formação. Logo que saí do 2º grau colegial, foi o curso que me deu a base de conhecimento empresarial e minha porta de entrada para o mundo corporativo.

Consegue resumir a trajetória da economista e CEO da Anglo American no Brasil?

Sou mineira, de Belo Horizonte. Estudei no Colégio Loyola, me graduei em Economia pela Universidade Federal de Minas Gerais UFMG e em Ciências Contábeis pela Fundação Mineira de Educação e Cultura Fumec. Possuo 28 anos de experiência profissional, tenho MBA em Finanças pelo Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais Ibmec e Educação Executiva pela Harvard Business School, Columbia University e London School of Economics.

Não conseguiu resumir, rsrsrs

Ingressei na Anglo American em 2012, durante a implantação do Sistema Minas-Rio, e, de 2015 a 2021, fui “Chief Financial Officer – CFO” das operações de minério de ferro e níquel no Brasil. Em 2021, me mudei para Londres, na Inglaterra, e, além do cargo de CFO na sede global da empresa, acumulei também, em 2022, o papel de diretora interina da área de Projetos de Capital do Grupo. Em dezembro de 2023, assumi o cargo de presidente da Anglo American no Brasil e, em fevereiro deste ano, comecei a presidir o Conselho Diretor do Instituto Brasileiro de Mineração Ibram.

Desconfiamos severamente de que ainda tem mais...

Em minhas experiências prévias na Anglo American, trabalhei por oito anos como auditora externa na Arthur Andersen e na Deloitte, como responsável por projetos de auditoria em grandes empresas brasileiras e multinacionais. De 2006 a 2012, trabalhei na Holcim (indústria de cimento), como “controller” das operações no Brasil.

Outra pergunta que daria um livro: o que foi; o que é a Anglo American?

A Anglo American é uma líder global em mineração, comprometida com a produção responsável de minerais e nutrientes agrícolas essenciais para viabilizar o futuro, impulsionar a descarbonização da economia global, melhorar os padrões de vida e fortalecer a segurança alimentar.

E no Brasil?

No Brasil, país onde temos mais de 50 anos de história, e, atualmente, atuamos nos negócios de minério de ferro de alto teor e de níquel, geramos em torno de 19 mil empregos, entre próprios e terceirizados, nos estados de Minas, Goiás e Rio de Janeiro. E possuímos investimentos de, aproximadamente, R$ 13 bilhões, previstos entre 2024 e 2028. Esses aportes integram ações de melhoria e manutenção das nossas operações, incluindo mais segurança, sustentabilidade e eficácia dos empreendimentos, além de investimentos nas comunidades anfitriãs e na preservação da biodiversidade.

A “praia” da Anglo American no Brasil é feita de minério de ferro, níquel, cobre e nióbio ou tem mais?

Atualmente, a Anglo American opera dois negócios no Brasil: minério de ferro e níquel.

Nossas reservas vão durar quanto tempo?

As reservas atuais nos dão a garantia de manter as nossas operações por muitos anos. Cabe enfatizar que a mineração vem evoluindo em processos inovadores que buscam, cada vez mais, um melhor aproveitamento dos minerais produzidos; o que pode trazer como benefício, o aumento da vida útil dos empreendimentos.

O que é Minas-Rio e Serpentina?

Nós celebramos recentemente o aniversário de 10 anos do primeiro embarque do Sistema Minas-Rio. Isto é, da primeira carga de navio com minério Minas-Rio. Nosso empreendimento contempla a produção e o beneficiamento de minério de ferro em Conceição do Mato Dentro e Alvorada de Minas, além de um mineroduto, com 529 km de extensão, passando por 33 municípios entre Minas Gerais e Rio de Janeiro, até a filtragem e a exportação no Porto do Açu, em São João da Barra, em uma operação conjunta com a Ferroport.

É o tal minério de ferro de alto teor?

O pellet feed produzido no Minas-Rio é de classe premium, com alto teor de ferro e baixos índices de impurezas. Nosso produto é essencial para a descarbonização da cadeia produtiva do aço, com baixas emissões de carbono, contribuindo para a redução das emissões de escopo 3 (emissões indiretas nas cadeias de valor). Em um mundo que se preocupa cada vez mais com a sustentabilidade, enxergamos em nosso minério muito potencial de valorização.

E a serpentina que não é a de Carnaval?

A Serpentina é um recurso mineral de alto teor que adquirimos da mineradora Vale, adjacente ao Minas-Rio. O acordo foi celebrado no início de dezembro, integrando esse corpo mineral ao nosso empreendimento. Nessa parceria, a Anglo American continuará a controlar, gerenciar e operar o Minas-Rio, incluindo eventuais expansões da Serra da Serpentina.

Qual o futuro da Anglo American e quais “os minerais do futuro da transição energética”?

A Anglo American iniciou um movimento em nível global de reestruturação de portfólio, passando a focar principalmente nos ativos de cobre, minério de ferro de alto teor e nutrientes agrícolas. A iniciativa tem o objetivo de reposicionar a empresa frente aos desafios atuais e às perspectivas futuras de geração de valor, permitindo a transição energética e apoiando a melhoria dos padrões de vida globais e a segurança alimentar.

Padrão de vida e segurança alimentar tem tudo a ver com futuro.

Sobre os minerais do futuro, a agenda de energia limpa e de transição energética é uma grande oportunidade para o setor de mineração no Brasil. Não há fonte de energia limpa que não demande minérios para a sua existência. Então, nosso país pode se consolidar como um dos maiores fornecedores globais para essa transformação, que inclui a produção de nióbio, lítio, terras raras, cobalto e quartzo. 

Como uma mineradora pode conjugar a palavra da hora: sustentabilidade? 

O propósito da Anglo American é reimaginar a mineração para melhorar a vida das pessoas. Por isso, seguimos atentos aos desafios do presente e do futuro, entendendo que a mineração só tem sentido se for para o bem de todas as partes interessadas, e de maneira que busque soluções para os desafios da sociedade. Em nossa empresa, temos um Plano de Mineração Sustentável, que busca ancorar nossos negócios nas melhores práticas de ESG e que estabelece, por meio de metas claras e objetivas, as ações da companhia nos pilares: ambiental, social e governança.

Estratégias e objetivos também rimam

Os objetivos desse plano incluem parcerias para melhorias nos sistemas de educação e de saúde das comunidades que acolhem nossas operações; geração de empregos desvinculados da cadeia da mineração; fortalecimento dos mecanismos de transparência e integridade; foco na redução da emissão de gases do efeito estufa nas plantas operacionais (com previsão de sermos neutros em carbono até 2040); gestão eficiente dos recursos hídricos utilizados na mineração; impacto positivo sobre a biodiversidade; segurança e responsabilidade nas operações; entre diversos outros temas.

Em todos os níveis?

Como destaque desses objetivos, desde 2022, 100% do consumo de energia elétrica das nossas operações no Brasil é certificadamente proveniente de fontes renováveis. Contamos, ainda, com cerca de 32 mil hectares de áreas protegidas no Brasil, entre Cerrado e Mata Atlântica, o que representa mais de seis vezes a nossa área operada no país.

Como vê o mercado global de mineração em um Brasil e um mundo tão conturbado e ameaçado?

A mineração é essencial para a sociedade, e os minerais estão presentes nas mais diversas situações e áreas da vida moderna. Trata-se de uma atividade fundamental, que precisa caminhar de forma responsável e sustentável, em vista do desenvolvimento global.

De volta ao futuro?

Não podemos deixar de lembrar que a agenda de energia limpa e de transição energética é uma janela de oportunidade para os próximos anos, indispensável para combater os efeitos das mudanças climáticas no planeta. Investindo nessa agenda, o Brasil pode inverter a geopolítica global dos minerais críticos e estratégicos, se consolidando como um dos maiores fornecedores do mundo.

Futuro com segurança

Sobre o mercado, independentemente das previsões que aparecem e das oscilações de preços do mercado de commodities, precisamos controlar aquilo que nos cabe, que é uma produção cada vez mais segura, eficaz e sustentável, oferecendo aos nossos clientes produtos de alta qualidade.

Para terminar, a começar pelo nome do estado, Minas Gerais: a mineração aqui é uma dádiva ou maldição?

A mineração é um dos maiores segmentos da economia brasileira – atividade estratégica para o nosso estado e nosso país, responsável por um legado de desenvolvimento social e tecnológico, além da contribuição para a arrecadação tributária e geração de empregos. O Brasil está entre os principais “players” mundiais em mineração e a Anglo American atua na valorização desse potencial estratégico, que visa manter o país fortalecido no cenário socioambiental e econômico mundial, sempre em busca de uma mineração cada vez mais segura, responsável e sustentável.

Vamos continuar vendendo o minério e comprando de volta tudo em que ele é transformado e beneficiado?

Para nos transformarmos em um estado cada vez mais industrializado e inovador, que saiba aproveitar seus recursos naturais, precisamos avançar em uma discussão ampla, que requer esforços do poder público, da iniciativa privada e da sociedade civil. Isso inclui mais investimentos em infraestrutura, políticas econômicas que incentivem novas indústrias, fomento à tecnologia, capacitação de pessoas, entre outros pontos importantes.