Dolce Vita | sábado, 6 de maio de 2023

Lindas, como a Holanda, Camila Chiari, Juliana Brasil e Gisele Loyola. Foto: Edy Fernandes

Vida doida

No site Psicologias do Brasil, achamos esta, do grande Ariano Suassuna (1927-2014): “Eu gosto é de gente doida!”. O que chamamos de loucura tem a ver mais com diferenças sociais e culturais do que com doenças biológicas. Não são poucos os teóricos da psicologia que denunciam como a loucura é usada para segregar e oprimir grupos sociais menos favorecidos.

Gente doida

Ariano Suassuna falou do quanto um “doido” pode ser alguém com uma criatividade e criticidade mal reconhecidas pelo seu meio. “Eu gosto muito de história de doido. Não sei se é por identificação. Eles vêem as coisas de um ponto de vista original. E isso é uma característica do escritor também”.

Gente profética

Continua Suassuna: “O escritor verdadeiro não vai atrás do lugar comum, ele procura o que há de verdade por trás da aparência. O doido é danado para revelar isso! Os doidos perderam tudo, menos a razão”. Pensamento que rima com o da psiquiatra Nise da Silveira (1905-1999), que revolucionou o tratamento da loucura no Brasil, propondo um tratamento humanizado, que usava a arte para reabilitar os pacientes.

Gente feliz

E Nise aconselhou: “Não se cure além da conta. Gente curada demais é chata. Todo mundo tem um pouco de loucura”. Claro que falamos da “loucura saudável e criativa”, não da violenta que, hoje, vai do Brasil à Ucrânia. Estamos falando daquele tipo que ilustra a “Balada do Louco”, de Os Mutantes: “Dizem que sou louco por pensar assim. Se eu sou muito louco, por eu ser feliz, mais louco é quem me diz e não é feliz”.

Linda como Amsterdam, Débora Maciel. Foto: Edy Fernandes

Feliz e genial

Por falar em loucura, a Holanda, ou Países Baixos, pode não ser uma potência, mas sempre esteve à frente de seu tempo, do nosso tempo. E não é só a linda Amsterdam. Tem também Rotterdam, uma grande cidade portuária. Depois de quase inteiramente reconstruída após a Segunda Guerra Mundial, a cidade é agora conhecida pela arquitetura arrojada e moderna.

Genial e atual

Erasmo de Rotterdam (1466-1536) foi um teólogo e filósofo holandês. Seminarista agostiniano tornou-se, com o passar do tempo, grande crítico da Igreja Católica. Apesar de ter frequentado a Universidade de Paris e lecionado Teologia na Universidade de Cambridge, optou por tornar-se um acadêmico independente. Seu livro mais famoso é o ensaio satírico “Elogio da Loucura”.

Atual e atualizado

Publicado em 1511, em Paris, “Elogio da Loucura” abalou “as estruturas do racionalismo secular e da escolástica cristã do século 16. O livro mantém seu frescor, principalmente pelos apreciadores das ciências políticas e sociais. A obra, que formou uma das bases intelectuais da filosofia humanista do Renascimento, ganhou nova edição pelo Grupo Editorial Edipro”.

Atualizado e inesgotável

No ensaio, Erasmo homenageia a “Utopia”, de seu grande amigo Thomas More e critica os costumes dos homens daquela época. Quem fala em nome do autor é a própria “Loucura”. Imaginem se Erasmo criticasse os homens de 2023! Ia faltar tempo de vida e, principalmente, elogio, mesmo que torto.

Linda como Rotterdam, Mariana Stambassi. Foto: Edy Fernandes

Lança Perfume

As ideias de Erasmo abriram espaço para que intelectuais como Lutero ficassem contra o Papa e lançassem as bases da Reforma Protestante. 

Ao longo das páginas, a “Loucura” elogia a si mesma como a verdadeira imperatriz da humanidade. 

Desta forma, o autor enaltece a natureza humana e oferece um espelho para que a sociedade possa se divertir e até mesmo rir de si própria.

Fabrina Magalhães Pinto, Doutora em História Social da Cultura, assina a apresentação desta nova edição.

E diz que os adversários do autor “não o entenderam ou não admitiram a pilhéria erasmiana sobre temas religiosos tão controversos”. 

A narrativa de Erasmo, armado com a zombaria, consegue atacar questões sérias de sua época. 

Temas morais como a intolerância e a ingratidão não escapam ao tom humorístico da “Loucura”. 

Dos reformistas protestantes liderados por Lutero aos ortodoxos cristãos seguidores do Papa, todos são alvos da ironia desta obra.

“A principal ocupação dos mundanos é acumular sempre riquezas e contentar em tudo e por tudo o próprio corpo, pouco ou nada se importando com a alma”. (“Elogio da Loucura”, pgs. 155 e 156)

“Elogio da Loucura” vai contra as morais católica e protestante.

Uma defesa aberta à tolerância, à liberdade de pensamento, ao mesmo tempo em que o autor constrói uma das maiores expressões do humanismo, base ideológica do Renascimento.

Ah! Se todo mundo fosse louco, no mínimo, para ler!