Dolce Vita | sábado, 11 de junho de 2022
No Bosque da Ribeira e das lindas, a anfitriã Camila Chiari com Rejane de Paula e Bruna Gontijo. Foto: Arquivo Pessoal
Paisagem Urbana
Hoje, para vosso deleite, um de nossos temas favoritos, via corretores de imóveis, a valorização dos mesmos, antes e pós-pandemia. Vamos lá: dito e ouvido num “happy hour” da categoria. Depois do “boom” por imóveis em luxuosos condomínios, nos arrabaldes de BH, o sonho da “dolce vita”, em meio à natureza, vida saudável e “home office”, parece ter acabado com a volta ao velho e feio normal.
Dilema urbano
Arrependidos da opção alegam que a distância do centro urbano tornou-se penosa para necessidades básicas como saúde, serviços, educação. Isso, além do fim do mesmo “home office” e, claro, da volta triunfal dos escritórios para muitos. Do revés de decisões passadas, pais de adolescentes são os que mais reclamam, alegando, sobretudo, a questão do transporte para festas e baladas.
Volta urbana
A moçada não quer ficar ilhada no conceito idealizado pelos pais. Outro fator considerado é o preço da gasolina. Neste contexto, imobiliárias apontam a revalorização de espaços urbanos como opção mais viável. Nesta seara, o ideal mesmo, é o sistema híbrido, apesar de nem todos terem o privilégio, o poder aquisitivo para tal.
Solução urbana
Manter uma casa de campo e outra urbana é salutar para a qualidade de vida. Pôr do sol, bicicletas, caminhadas nas montanhas, ar livre, espaço verde, esportes náuticos, por exemplo, são tudo de bom. Isso, além de inesquecíveis. Construtores, arquitetos e decoradores, que ganharam muito durante a pandemia, agora, neste “clima”, bem poderiam voltar aos empreendimentos no doce “asfalto selvagem”.
Dissolução urbana
Saem os profissionais, volta nossa humilde opinião. Dizem os franceses, com sabedoria, que não se pode ter a manteiga e o dinheiro da manteiga. Escolher é preciso. Claro, quem pode morar na cidade, perto de tudo e, nos fins de semana, feriados prolongados, tendo um segundo lar, em meio à natureza, faz parte de uma minoria deveras rara. O sol nasce para todos, mas a sombra para os seletos.
Conflito urbano
No mais, não podemos esquecer que, no Brasil, os fins vêm antes dos meios. Por exemplo, não há transporte urbano decente para quem mora longe do “agito”. Quando há, os horários são bem limitados e inimigos da vida noturna, logo, da vida dos jovens. Outro exemplo é a draconiana Lei Seca. A pessoa não pode beber e, claro, dirigir. Em compensação, também não pode contar com táxi ou Uber nas altas horas. Quando sim, os preços são inviáveis, fora as longas esperas.
Mesmo sem bosque, a bela natureza em vermelho de Carol Caran. Foto: Edy Fernandes
Lança Perfume
*Não, a culpa não é do Bolsonaro!
Senão, vejamos. Este panorama também passa por hábitos arraigados.
Nas grandes cidades do mundo, o transporte urbano funciona às mil maravilhas, “ma non troppo”. Até meia noite.
Algumas cidades, as mais boêmias e jovens, oferecem metrô e trem 24h, pelo menos nas linhas mais movimentadas. Não é o caso do Brasil, muito menos de Belo Horizonte.
Até a noite lá longe sempre foi dos ricos que têm carro, motorista e leis mais brandas, civilizadas. Aqui, também, onde os justos pagam pelos pecadores.
Os justos são os que dirigem sem o efeito do álcool. Os pecadores são os que abusam do álcool, da lei, da própria vida e da vida alheia.
E justamente os justos não saem à noite, Quando sim, jantam, bebem moderadamente e voltam seguros para suas camas e Netflix.
Belo Horizonte não tem metrô e, pelo jeito, nunca terá. Por quê? Porque o direito - de ir e vir – é só para quem pode. Metrô 24h, então, só rindo de desespero.
O resultado disso, em longo prazo, são os guetos, coisa que já podemos apreciar e não só em condomínios; aqueles que já são verdadeiras cidades independentes.
Independentes, mas longe da “muvuca” social que move a vida de qualquer cidade saudável.
Assim, voltemos ao resultado. Vida comunitária, bares e restaurantes próximos aos domicílios. Em vez da cidade, estaremos restritos a bairros.
Também sem bosque, mas esbanjando gostoso inverno, Elisa AraújoFoto: Edy Fernandes
Bairros onde tudo é mais próximo, onde os carros serão secundários e a diversão menos perigosa.
Pausa para lembrarmos mais uma profecia do saudoso arquiteto e ex-governador do Paraná, Jaime Lerner: “o carro é o cigarro do futuro”.
Mas voltando à vaca gelada! O carro só será supérfluo quando o transporte for coletivo, democrático.
Quando o transporte público for confortável, seguro e farto; o que em Belo Horizonte ganha ares de ficção científica.
Resumo da ópera bufa. Somos prisioneiros não de pandemias, mas da falta de visão e do egoísmo dos que governam, fazem leis e forçam hábitos que só eles não precisam cumprir e seguir.
Para tal bastaria seguir aquele ensinamento: “não queira para os outros, o que não quer para você”.