Dolce Vita | domingo, 30 de maio de 2021

Viva a vida, viva a beleza de Gabriela Agustini. Foto: Edy Fernandes

A gente e nós

Qual a inspiração de hoje? Um texto que circula na Internet, pelo menos há dois anos. Atire a primeira máscara quem não perdeu um amigo, um próximo querido, um conhecido nesta pandemia. E a morte dos outros faz lembrar que nós também somos mortais. Daí o interesse de refletirmos sobre o texto a seguir que, simples, contém a maior verdade da grande aventura humana. “A gente vai embora e fica tudo aí”. 

Nós e os planos

“A gente vai embora e fica tudo aí. Os planos a longo prazo e as tarefas de casa, as dívidas com o banco, as parcelas do carro novo que a gente comprou para ter status. A gente vai embora sem sequer guardar as comidas na geladeira; tudo apodrece e a roupa fica no varal”. Mesmo se a maioria das pessoas deixa alguém para limpar a geladeira, tirar e doar as roupas secas no varal. “A gente vai embora, se dissolve e some toda a importância que pensávamos ter; a vida continua, as pessoas superam e seguem suas rotinas normalmente”.

Nós e os nós

“A gente vai embora e as brigas, as grosserias e a impaciência serviram para nos afastar de quem nos trazia felicidade e amor. Todos os grandes problemas que ‘tínhamos’ se transformam em um imenso vazio, não existem problemas. Os problemas moram dentro de nós. As coisas têm a energia que colocamos nelas e exercem em nós a influência que permitimos”.

Os nós e as nozes

“A gente vai embora e o mundo continua caótico, como se a nossa presença ou ausência não fizesse a menor diferença. Na verdade, não faz mesmo! Somos pequenos, porém, prepotentes. Vivemos nos esquecendo de que a morte anda sempre à espreita. Pois é. É bem assim: piscou, a vida se vai… Até o cachorro mais fiel é doado e se aprende a amar os novos donos. Os viúvos se casam novamente, fazem sexo, andam de mãos dadas e vão ao cinema”.

As nozes e as cascas

“A gente vai embora e somos rapidamente substituídos no cargo que ocupávamos na empresa. As coisas que sequer emprestávamos são doadas, algumas jogadas fora”. São as pequenas coisas da vida que, sem valor material, só tinham importância para o dono. “Quando menos se espera, a gente vai embora. Aliás, quem espera morrer? Se a gente esperasse pela morte, talvez a gente vivesse melhor”.

As cascas e o universo

“Talvez a gente colocasse nossa melhor roupa hoje, talvez a gente comesse a sobremesa antes do almoço. Talvez a gente esperasse menos dos outros. Se a gente esperasse pela morte, talvez perdoasse mais, risse mais, saísse à tarde para ver o mar, talvez a gente quisesse mais tempo e menos dinheiro”. É aquela linda canção dos Titãs, “Epitáfio”, sobre o mesmo tema, após a morte de um dos integrantes: “Devia ter amado mais, ter chorado mais, ter visto o sol nascer”.

A vida mais viva em Rafaela Nejm. Foto: Edy Fernandes

O universo e nós

“Devia ter arriscado mais e até errado mais. Ter feito o que eu queria fazer. Queria ter aceitado as pessoas como elas são. Devia ter complicado menos, trabalhado menos, ter visto o sol se pôr. Devia ter me importado menos com problemas pequenos. Ter morrido de amor. Queria ter aceitado a vida como ela é. A cada um cabe alegrias e a tristeza que vier”.

Nós e nada

Mas voltando ao texto, tema inicial: “Quem sabe a gente entendesse que não vale a pena se entristecer com as coisas banais, ouvisse mais música e dançasse mesmo sem saber. O tempo voa. A partir do momento que a gente nasce, começa a viagem veloz com destino ao fim – e ainda há aqueles que vivem com pressa! Sem se dar o presente de reparar que cada dia a mais é um dia a menos, porque a gente vai embora o tempo todo, aos poucos e um pouco mais a cada segundo que passa”.

Nada e tudo

O que você está fazendo com o pouco tempo que lhe resta? Que possamos ser cada dia melhores e que saibamos reconhecer o que realmente importa nessa passagem pela Terra! Até porque, a gente vai embora…”. E não deixamos nem a casca de nós. Deve vir daí o universo, sempre renascendo de nós e de nossas mortes. “O Universo numa casca de nós e de noz”.

Vida louca, vida breve, uma homenagem a Rebeca Biank. Foto: Edy Fernandes

Lança Perfume

*Dizem que, na semana passada, foi comemorado o “Dia dos Mineiros”. Isso existe mesmo, ou é mais uma peça pregada pela Internet e redes sociais?

Na mesma Internet, o “Dia dos Mineiros” é 12 de setembro, como o Dia do Nordestino é 13 de dezembro.

Não dá para acreditar em mais nada, muito menos que, o texto a seguir, seja de Carlos Drummond de Andrade. Está mais para o estilo de outro ilustre mineiro e escritor, Fernando Sabino.

"Ser Mineiro é não dizer o que faz, nem o que vai fazer, é fingir que não sabe aquilo que sabe, é falar pouco e escutar muito, é passar por bobo e ser inteligente”.

“Ser Mineiro é vender queijos e possuir bancos. Um bom Mineiro não laça boi com imbira, não dá rasteira no vento, não pisa no escuro, não anda no molhado”.

“Não estica conversa com estranho, só acredita na fumaça quando vê o fogo, só arrisca quando tem certeza, não troca um pássaro na mão por dois voando”.

“Ser Mineiro é dizer ‘uai’, é ser diferente, é ter marca registrada, é ter história. Ser Mineiro é ter simplicidade e pureza, humildade e modéstia, coragem e bravura, fidalguia e elegância”.

“Ser Mineiro é ver o nascer do Sol e o brilhar da Lua, é ouvir o canto dos pássaros e o mugir do gado, é sentir o despertar do tempo e o amanhecer da vida”.

“Ser Mineiro é ser religioso e conservador, é cultivar as letras e artes, é ser poeta e literato, é gostar de política e amar a liberdade”.

“Ser mineiro é viver nas montanhas, é ter vida interior, é ser gente".

Pensando bem e sem querer jogar água no chope, desmistificar o mito e estragar prazeres imodestos, nossas grandes qualidades acima, são também nossas grandes fraquezas”.

Mineiros são enfurnados em montanhas, desconfiados, sempre pedindo perdão.

Falam e pensam uma coisa, fazem outras, bem mineiramente. Afinal, como diria outro grande mineiro, Otto Lara Resende, “A tocaia é a grande contribuição de Minas à cultura universal”.

Somos desconfiados ou sonsos e dissimulados, “há 200 saindo da igreja”, destilando moral na ousadia dos outros?

Cadê o mineiro, como “Raposa Política”, depois de Juscelino Kubitscheck?

Em Tancredo que morreu na véspera? No vice de Collor, Itamar, nascido no mar? Em Dilma, que só é mineira quando sai de Porto Alegre, levando uma surra para o Senado?

Pensando bem, o mineiro é tudo isso, por isso, tão único e universal ao mesmo tempo. Bom domingo.