Dolce Vita | domingo, 25 de abril de 2021
Domingo ainda mais lindo, com Marina Rezende. Foto: Edy Fernandes
Fim de linha
“É quase inacreditável, mas um dos chefs mais geniais e bem sucedidos do mundo acaba de fechar todos os seus restaurantes em Barcelona definitivamente”. A frase tem efeito, mas nada de “inacreditável” já que, em todo mundo, os maiores templos gastronômicos faliram, estão falindo ou a caminho de, incluindo, claro, o Brasil. Então, recapitulando o “inacreditável”.
Fim de ciclo
Impedido de trabalhar há mais de um ano devido à pandemia – já que suas casas dependiam fortemente do turismo estrangeiro – Albert Adrià acaba de anunciar o fim de seu império, que reunia os restaurantes Tickets, Pakta, Hoja Santa, Enigma (que somavam quatro estrelas Michelin) e a Bodega 1900, provavelmente o melhor “boteco” que já existiu na mesma Barcelona.
Fim de sonho
A notícia foi divulgada por um representante do Grupo Iglesias, empresa da qual Adrià era sócio e que comandava El Barri, seu projeto reunindo vários restaurantes nos arredores da avenida Paral-Lel, a qual ajudou a renascer depois de uma grande reforma. Segundo divulgado pela imprensa catalã, o grupo soma mais de € 7,5 milhões em dívidas.
Fim do fio
Em entrevistas a jornais locais, Albert disse que fará um balanço de sua vida para refletir se vale a pena seguir na alta cozinha e se compensa ter um restaurante. A notícia, tristíssima, é um fiel retrato de como a alta gastronomia se encontra no mundo todo: por um fio. Tudo muito triste realmente. E fica ainda mais triste quando sabemos que o cenário não se restringe à alta gastronomia, mas à toda a Economia.
Domingo ainda mais cheio de charme, com Norah Lapertosa. Foto: Edy Fernandes
E agora Glória?
O que é Luxo neste momento? Em entrevista na revista Versar, 2018, Glorinha Kalil enfatizava o comportamento. Em tempos de “tudo que se tem representa nada”, com nossos armários inúteis e sem “vitrine” para exibições, certamente as roupas lá dentro estariam certas de que seus donos morreram. Hora de doar os excessos? E as joias? Vão brilhar onde? Luxo? Ser chique é ser solidário?
E agora José?
Vejam agora as 1001 campanhas para combater a fome. Luxo, agora, também é rever valores? Simplificar? Dividir? Reavaliar o sentido da vida? Que lição podemos tirar dessa adaptação a novos costumes? Enfim: luxo e lixo na ordem do dia! A triste verdade é que, aparentemente, tudo continua “normal”, no “no novo normal”, com campanhas solidárias e tudo o mais. Ou bem menos.
E agora Mané?
Neste “anormal normal”, nada de novo no front. O egoísmo continua firme e forte, jogando esmolas e migalhas, para enganar a própria consciência do que entende ser social e solidário. Basta olhar para os lados para perceber que os ricos estão cada vez mais ricos e encastelados; os pobres cada vez mais miseráveis, doentes, frágeis e vulneráveis.
E agora Unicórnio?
Dentro deste tema sombrio, uma recente luz vinda do deputado francês, “verde” e de esquerda, François Ruffin, em seu novo livro – sim, na França, deputados sabem escrever – “O Progresso deles e o nosso – De Prometeu ao 5G”. Resumindo, os perigos do progresso, que às vezes é retrocesso. Entre outras reflexões interessantes: “Com a pandemia, tecnologicamente, avançamos, ganhamos 20 anos. Fazemos tudo ‘online’, pedimos comida, bebida, etc., até sexo, o que já vinha ocorrendo há muito tempo”.
E agora futuro?
Na verdade, é uma ironia, Ruffin prova o contrário, que perdemos 20 anos. Quem quer este tipo de mundo e de vida? As pessoas realmente querem uma vida “online” e perder o social, a vida verdadeira? No fim, a crise é oportunidade para quem, tirando as empresas de tecnologia? “Antigamente”, tecnologia era luxo para poucos, hoje é obrigatória para todo mundo. Vemos uma inversão de valores.
E agora o quê?
Hoje, luxo é ter contato, não pelo celular, mas com o ser humano, com gente de verdade. Privilégio reservado aos ricos que podem se dar ao luxo de um contato direto, sem teclar: seus “mil” secretários, assistentes e “coachs”, os novos “empregados e empregadas domésticas”; prontos e exclusivos, que resolvem todos os problemas dos ricos, mais dominadores e dominantes que nunca.
Domingo ainda mais espetacular, com Patrícia Coutinho. Foto: Edy Fernandes
Lança Perfume
*Dentro das variações sobre o mesmo tema, reflexões bem humoradas do economista, Paulo Roberto Bretas, sobre os novos tempos.
Não concordamos com todas, mas, não deixam de ser engraçadas e muito irônicas, quase absurdas.
Hoje, precisamos aprender a respirar sem oxigênio, morrer dentro de ambulância, esperar vaga em UTI, se alimentar sem comida.
Sobreviver sem emprego e sem renda, acreditar na mentira e negar a realidade, usar máscara sem assaltar ninguém, achar que a economia vai decolar com subida de juros.
Acreditar no ministro da Economia; acreditar que um auxílio emergencial de R$150,00 por família vai auxiliar; estudar e aprender sem ir à escola.
Acreditar em tratamento precoce e morrer precocemente, pedir comida via aplicativo quase todos os dias, mesmo com pouca grana.
Passar a comer menos de três refeições por dia, fazer compras “online”, quando a internet funciona no iPhone velho; ter sua loja fechada e seguir pagando impostos e tendo outros gastos.
Não conseguir trabalhar, nem informalmente; esperar pela vacinação em massa, sem ter vacina para a massa; aprender que “rachadinha” é uma forma de corrupção.
Enfrentar o desafio de pegar ônibus/metrô lotado, sem pegar Covid-19; lavar as mãos com maior frequência sem água encanada.
Não aglomerar numa casa de quarto e sala, com mais de cinco moradores; manter a calma quando tudo está ruindo ao seu lado.
Despedir dos amigos que morreram, à distância; ouvir os noticiários falando de Covid-19 e de morte todos os dias, muitas horas por dia.
Andar de carro sem colocar muita gasolina; enfrentar a inflação do dólar, com poucos reais no bolso.
Esperar que tudo passe, com esperança decrescente; acreditar na justiça, numa sociedade injusta; amar sem abraçar ou beijar.
Arrepender-se de alguns votos dados nas eleições mais recentes, seguir vivendo apesar das perdas irrecuperáveis.
Acordar e dormir cedo, mesmo estando em “home office” e não se deixar guiar pelos falsos profetas.