Dolce Vita | domingo, 20 de setembro de 2020

Belas em dose dupla, Fernanda Carvalho e Dani Nogueira

Foto: Edy Fernandes


Filosofia no shopping

Semana passada, no BH Shopping, lembramos de José Isaac Peres, fundador do Grupo Multiplan, responsável, há 45 anos, por 19 shoppings espalhados por todo o Brasil, incluindo o mesmo BH Shopping, Pátio Savassi e DiamondMall. Numa longa live, em maio, Peres falou, entre mil outras coisas que, apesar da digitalização do varejo, o shopping não vai acabar. Para ele, o maior espetáculo do shopping são as pessoas, não as lojas.

Filosofia encantada

José Isaac Peres está certíssimo, “profetizou na mosca”. O glamour, o shopping como centro gastronômico, de integração e compras, claro, jamais perderá esse encanto. Por mais que sejam “gaiolas de ouro”, os shoppings, como o antigo comércio de rua, são um encontro marcado com a tradição, o lazer, a economia, o entretenimento, a vida como ela é. Observar o BH Shopping e suas criaturas foi uma aula de sociologia.

Filosofia de vida

Num legítimo “voyeurismo”, registramos o reencontro das pessoas, como se elas estivessem voltando das férias, de uma longa viagem. Ou seja, voltando de um confinamento. As pessoas se redescobrem num admirável mundo novo, depois do fim do velho mundo. As pessoas estavam e estão sedentas por contatos visuais e pessoais. É sintomático confirmar como todos estávamos com a síndrome da abstinência.

Filosofia na pandemia

Vemos um novo olhar, como se estivéssemos saindo da toca depois de uma tempestade na Arca de Noé, como se escapássemos do bunker, depois de meses sem ver a luz do sol ou, no caso, uma vitrine de loja. Uma reintegração à tribo. Coisa típica de um pós-guerra, pós-pandemia, com as pessoas loucas para consumir e reencontrar seus iguais, seus semelhantes, depois deste inédito isolamento. Uma demanda reprimida, desabrochando com a primavera.

Filosofia platônica

É como se saíssemos da Caverna de Platão depois de longa hibernação. Como se as pessoas acordassem anos depois de um congelamento ou um coma. Como no filme “Adeus, Lênin” (2003), quase uma comédia, onde uma comunista ferrenha, de Berlim Oriental, depois de um longo período inconsciente, acorda após a queda do muro, numa Berlim unificada em torno das benesses, hábitos e modernidade do capitalismo.

Filosofia de botequim

É um renascimento na própria horta, quintal ou praia. De repente, lá estão bares e restaurantes quase como antes. Todo mundo muito amável. Bonito ver, reencontrar famílias, crianças brincando, namorados entre beijos, abraços e carinhos sem ter fim. Tudo muito “novo” e interessante. Fora a moçada do Belvedere e Nova Lima extravasando, contrastando com o medo que ainda reina em Lourdes e no resto da cidade. Sede de amizade, amor, sexo, contato, conversas. De vida.

Filosofia doméstica

No mesmo clima, relembramos aqui outra novidade, outro sinal do final dos tempos, começo de outros: o crescimento, a explosão do turismo doméstico em Minas e no Brasil. Em Escarpas, no feriado do 7 de Setembro, impossível achar casas a alugar. No final do ano, o preço médio de um aluguel beirando os R$ 25, R$ 30 mil. Uma revalorização das proximidades, do nosso quintal, em sítios, fazendas condomínios etc. Mesma coisa, nem tão longe, em Angra dos Reis, Rio de Janeiro, ou Campos do Jordão, São Paulo.

 

Bela em dose única, Jô Guerra

Foto: Edy Fernandes


Belas ao quadrado, Luiza Nascimento e Carla Azevedo

Foto: Edy Fernandes


Lança-Perfume

* Reflexão do dia e anônima, mas atribuída ao poeta Manoel de Barros, sem ter nada de seu estilo: “Certa vez, quando eu passava por um momento muito difícil, sonhei que seria operado do coração. Angustiado, eu pensava que não sobreviveria à operação. Não sei como fui parar ali, por quais caminhos andei ou fui levado. Sabia apenas que haveria uma operação e eu era o paciente”.

“De repente, adentra a sala de cirurgia o cirurgião. Ao vê-lo, meu medo desaparece, cheguei até a sorrir... O médico era ninguém mais, ninguém menos que o poeta Fernando Pessoa! No princípio, achei estranho. Mas fazia sentido ser um poeta o cirurgião de um coração angustiado. Sem demora, o cirurgião-poeta abriu meu peito, mas não com bisturi: não sangrou, nem houve dor”.

“Com as duas mãos, o poeta tirou meu coração do peito: ‘Ele está pesado como um paralelepípedo! Preciso extrair o que lhe pesa’, diagnosticou. ‘O que lhe pesa não é coisa física, é a mágoa com o passado, a decepção com o presente, o medo do futuro e a descrença nos homens’, disse”.

“Quando olhei, meu coração estava minúsculo, uma semente salva de um fruto que perecia. Protestei: ‘Poeta, com esse coração pequenino não vou sobreviver!’. O cirurgião-poeta então respondeu: ‘Ele está assim pequeno porque deixei apenas o coração da criança’. Quis registrar o sonho e me virei para pegar caneta e papel. Então, algo caiu ao meu lado na cama, era um livro que adormeci lendo: ‘O Eu Profundo e os outros Eus’, de Fernando Pessoa. Os delírios verbais me terapeutam” – agora sim, Manoel de Barros.

E ainda mais Manoel de Barros, sobre a morte: “A vida é uma conformação. Pelas pessoas que se vão, pelas coisas boas que perdemos. Muitas vezes vivemos para perder, principalmente na velhice. O tempo não morre. O tempo nasce. Não devemos ter esse sentimento melancólico pelo tempo que passa. Devemos estar abertos para o novo, para o futuro, para o tempo que vem”.