Dolce Vita | domingo, 2 de janeiro de 2022
Lindo ano novo, com Ana Lívia Werdine. Foto: Edy Fernandes
Feliz ano novo!
Eis nossa primeira coluna do ano! O texto de hoje, “nossa filosofia de domingo”, era para ter sido a “coluna de fim de ano”. Mas na correria, acabou na fila, o que não tem importância porque todo fim é também um começo e vice versa. O texto fala sobre o tempo “que é curto e não para de passar”, como queria Vinicius de Moraes. Tempo é reflexão para fim, começo e ano inteiro, logo, não perde a validade.
Feliz ano velho!
No perigoso e preguiçoso mundo da Internet e redes sociais, recebemos este texto, atribuído, pasmem, a Rubem Alves (1933-2014) e até mesmo a Mário de Andrade (1893-1945). Na verdade ele é da autoria do teólogo cearense, Ricardo Gondim. Há anos circula pela mídia e foi interpretado, inclusive, pelo saudoso Antônio Abujamra, em seu programa, “Provocações”, na TV Cultura de São Paulo, em 2012.
Feliz tempo
“Tempo que Foge”. Vamos a ele: “Contei meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui para a frente do que já vivi até agora. Tenho muito mais passado do que futuro. Sinto-me como aquele menino que recebeu uma bacia de cerejas. As primeiras, ele chupou displicente, mas percebendo que faltam poucas, rói o caroço”.
Tempo feliz
“Já não tenho tempo para lidar com mediocridades. Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflamados. Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram, cobiçando seus lugares, talentos e sorte. Já não tenho tempo para conversas intermináveis, para discutir assuntos inúteis sobre vidas alheias que nem fazem parte da minha”.
Tempo compositor
“Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas, que apesar da idade cronológica, são imaturos. Detesto fazer acareação de desafetos que brigaram pelo majestoso cargo de secretário-geral do coral. As pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos. Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a essência, minha alma tem pressa...”.
Compositor de destinos
“Sem muitas cerejas na bacia, quero viver ao lado de gente humana, muito humana; que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos, não se considera eleita antes da hora, não foge de sua mortalidade, Caminhar perto de coisas e pessoas de verdade, O essencial faz a vida valer a pena. E para mim, basta o essencial!”. Que soco no estômago! Que carinho!
Tempo e vento
Por falar nisso, outra pérola de Ricardo Gondim: “Um grande carinho nasce sem se saber como. Vem como o vento e areja nosso olhar. Um grande carinho nasce sem paternidade, vem do nada e nos tange sem rumo”. Mas voltando ao texto, além de um carinho, pela beleza, também é um soco no estômago porque explicita a mediocridade e o egoísmo que reinam no ser humano, mesmo depois de uma pandemia mostrando o quão somos frágeis e perecíveis.
Tempo velho
Muita gente passa o ano pregando, falando e escrevendo “coisas bonitinhas”, pérolas de autoajuda; lições de moral e bons costumes; tudo com o verniz do politicamente correto e das melhores intenções, aquelas mesmas que povoam o inferno. Mas na Hora H, do vamos ver, “Farinha pouca, meu pirão primeiro ... Vigora a lei do cada um por si e o diabo para todos”.
Tempo novo
Finalmente, apesar de tudo e sinceramente, torçamos para que o bem prevaleça e as pessoas de bem, que são muitas, possam agir. 2022 promete ser emocionante, com eleições num país mais partido e dividido que nunca. Que Deus nos proteja e nos livre de todo Mal. Que no final do ano o Brasil, feliz, com o dever cumprido, com seu destino, tenha clima e paz para torcer por mais um título na Copa do Mundo. No mais boa sorte para todos nós!
Belo ano novo, com Natália Queiroz. Foto: Edy Fernandes
Lança Perfume
*Se a pandemia e a consciência do tempo que foge não resolvem, 2022 promete ser mais um ano individualista, como sempre.
Ops! Por falar em pandemia, que em 2022 o mundo fique livre desta e de outras doenças que matam ou ferem, corpos e almas.
Que o mundo pare de brigar e matar nas inúteis guerras de sempre, também movidas por quem sempre quer mais poder e dinheiro.
Cabe a cada um de nós levar a vida e ver a vida dos outros com a própria consciência, a consciência da insônia culpada ou aquela que bate no travesseiro e dorme no melhor dos mundos.
Fica o consolo do “Poeminha do Contra”, não de um teólogo, mas de outro Mário, outro poeta, Mário Quintana: “Todos esses que aí estão atravancando meu caminho, eles passarão... Eu passarinho!”.
Ficam também, para começar o ano bem, outras frases e pensamentos do homenageado de hoje, Ricardo Gondim.
“Li muito e aprendi pouco, mas o pouco que aprendi me estimulou a continuar lendo muito”.
Perfeito ano novo, com Yasmim Alvarenga Brum. Foto: Edy Fernandes
“Mais fácil conquistar uma cidade inteira que o amigo ferido”.
“Nem tudo que acontece em nossa vida é propósito de Deus, mas podemos transformar os nossos infortúnios em alguma coisa bonita!”
“Nasci condenado a viver uma só vez. Assim, darei a cada instante o valor de uma eternidade”.
“Devagar, o tempo transforma tudo em tempo. O ódio transforma-se em tempo. O amor transforma-se em tempo. A dor transforma-se em tempo”.
“Os assuntos que julgamos mais profundos, mais impossíveis, mais permanentes e imutáveis, transformam-se devagar em tempo”.
“Mas, por si só, o tempo não é nada, a idade não é nada, a eternidade não existe”.
Como queria Guimarães Rosa, mais que nunca o mundo precisa tornar a começar.
Para terminar a coluna e começar 2022, com mais literatura, agora, Rubem Braga.
"Desejo a todos, no Ano-Novo, muitas virtudes e boas ações e alguns pecados agradáveis, excitantes, discretos, e, principalmente, bem-sucedidos”.