Dolce Vita | domingo, 18 de outubro de 2020
Bandeira branca e geral na coluna de hoje, primeiro, com Fabi Lopes
Foto: Edy Fernandes
A bandeira e o bom gosto continuam com Isabella Tavares
Foto: Edy Fernandes
A bandeira termina com a mesma graça e beleza de Marcela Menin
Foto: Edy Fernandes
Mesmo horizonte
Uma grande amiga, mineira, radicada em Miami, envia-nos uma “crônica”, com o seguinte comentário: “Recebi este texto datado de 2008 e, 12 anos depois, ainda continua tudo igual. Amei, tem tudo a ver com BH. O que dizer?”. A amiga recebeu as reflexões com o título “O Poder do Dinheiro”. Só ao final ela leu a fonte: “Jornal Pampulha, Coluna Navarro, 20 de janeiro de 2008”.
Mesmo túnel
Doze anos! Nem nos lembrávamos deste texto, inspirado em outro de Danuza Leão. Foi citado, adaptado, comentado e ganhou acréscimos, ainda perfeitamente válidos. Hilário e triste ver como BH e o Brasil, mesmo durante a pandemia, mudaram nada. Pior, continuam os mesmos. Um mundo egoísta, individualista, seguindo a bandeira do “salve-se quem puder” e azar de quem nem pode. Vamos a ele, sem mais delongas.
Mesmo dinheiro
“O problema do dinheiro é que ele está caindo em mãos despreparadas de pessoas inseguras, que não conseguem decidir sozinhas o que fazer, do que gostar. Como eles não sabem das coisas, a única solução é fazer tudo igual aos outros”. Adoramos as palavras de Danuza Leão na crônica “Down no High Society”, publicada na revista “RG Vogue”, em dezembro de um ano dourado (2007).
Mesmo dos mesmos
Danuza afirma que os anos dourados se foram e o glamour acabou. Restou a nova sociedade, fácil de ser reconhecida. E como é fácil! Por exemplo, em restaurantes (dos mais caros), a turma só se comunica com os da mesma classe social. Coitado do pobre gaiato que quiser se infiltrar no grupo dos novos ricos. Vai ser completamente ignorado. O que conta é o dinheiro: “Até porque os nobres andam muito pobres, alugando seus castelos para a plebe visitar”, diz Danuza.
Mesma sociedade
A nova sociedade, um tipo de “clube sem carteirinha”, viaja sempre com as mesmas pessoas, frequenta os restaurantes da moda (descobertos em revistas) e faz compras em grifes que ostentam símbolos em suas roupas e acessórios. Vemos isso claramente em lugares como a Lagoa Seca do Belvedere (a praia de BH), nos restaurantes, cafés, academias, boates finas e também em Escarpas do Lago, vitrine do dinheiro novo e dos aparecidos.
Mesma vidinha
É um verdadeiro desfile de músculos e carrões importados, tênis que valem ouro e camisas com grandes logomarcas estampadas. Escolher um rótulo sem a ajuda de um sommelier ou criticar o menu de um chef em voga? Nem pensar! Já os mais metidos, que fizeram qualquer cursinho sobre vinhos, sentem-se grandes entendedores do assunto e adoram alardear seus conhecimentos em voz alta.
Mesmo vazio
Ainda sobre o desfile de músculos e carros importados. Os garotões, os “tarlinhas”, corpos de Tarzan com cabeça de galinha, num contínuo desfile de dinheiro novo. Porsches, Ferraris, Maseratis zoando e competindo motores o dia inteiro, de “lá para cá”, em barulhos e velocidades infernais, lembrando o que Juca Chaves falava do motoqueiro exibicionista; “Faz muito na motoca, mas faz pouco na mulher”.
Mesmos novos
Ah! Aos novos ricos também é imprescindível saber os nomes e detalhes dos badalados hotéis-butique do mundo, qual é último grito da moda, além de soltar o comentário certo na hora certa. Claro, comentário lido em alguma revista. Fala Danuza: “O mundo se tornou um imenso supermercado de produtos tão iguais, que nivela as pessoas e anula o desejo”. E as casas? Nada de objetos afetivos ou fotos que contem sua história.
Mesmo assim
Interrompemos 2008 para exclamar e perguntar: calma aí! Tem nada de positivo em 2020? Se quiserem um pequeno detalhe, tem sim. No mesmo paraíso, dentro do caos, Belvedere, Seis Pistas e Nova Lima, a região mais rica do Brasil, notamos alguma luz. Do dinheiro “velho” de Lourdes para o dinheiro “novo” do novo paraíso; noções de respeito aos pedestres que inundam as ruas, caminhando, correndo, usando uma moda despojada, esportiva e casual que, depois, como no Rio de Janeiro, enche os bares e restaurantes, sem constrangimento.
Mesmo assado
O número de “atletas” cresceu significativamente neste ar praiano de BH, ar de balneário da mesma Lagoa Seca. Muita gente bonita entre os novos bairristas destes novos “bairros”. Todos se conhecem nas caminhadas e depois, nos bares, com ou sem as restrições do momento, sempre cheios. Uma nova simplicidade ao lado da velha ostentação de riqueza. Cultura que é bom, nada. Nada de livrarias, mas muitas butiques, grifes e lojas chiques. Dá até para confundir as avenidas Niemeyer, em BH e no Rio.
Lança-Perfume
* Voltando aos mesmos ricos de 2008 e de hoje. As cozinhas (duas, por sinal) são um luxo, recheadas de eletrodomésticos de design, mas nenhum ingrediente comum à vista, necessário a qualquer refeição, como nas casas normais. A falta de personalidade rima coma falta de criatividade: como não sabem do que gostam, contratam designers que se rendem aos negócios e fazem tudo sempre igual, com a mesma cara de mostra de decoração.
A mesma lama. Também não sabem o que é um bom livro ou um bom filme; leem e veem o que está na moda. Como brinca Danuza: “É dura, duríssima, a vida no novo jet set”. E aí? O que acharam? Concordam? Muito cruel? Muito pertinente e verdadeiro? Muito impressionante, isso sim. Muito desolador perceber que tudo o que passamos em 2020 não será suficiente para novos olhares e novas prioridades.
Minas, Brasil e mundo continuarão os mesmos porque as pessoas continuam as mesmas. Sem generalizar, a pandemia, em vez de consolidar e unir, aumentou o número de divórcios que eram vulcões adormecidos em casamentos extintos. A tecnologia? Ajudou sim. Antecipou uma tendência, claro. Mas em vez de ligar as pessoas, reforçar contatos, separou-as ainda mais. No trabalho e até nos próprios lares.
Se antes da pandemia já não havia diálogo; almoços e jantares aconteciam com talheres e celulares, hoje acontecem com celulares e talheres. Se as pessoas se comunicavam apenas no trabalho, hoje, nem isso porque o trabalho virou teletrabalho. O trabalho voltará, presencial, mas as pessoas talvez voltem ainda mais ausentes.
E os ricos, o tão citado e criticado jet set tratado por Danuza? Ah! Para estes não tem jeito que dê jeito. Continuam esnobes, em seus seguros castelos, com televisões do tamanho de um cinema e geladeiras transbordantes. Não podem sair do Brasil? Sem problema. Vão em hordas aos lugares de sempre que, se antes eram para curtos feriados, hoje servem para longas férias. Sim, ganha o turismo nacional, depois de tanto sofrer. Perdem as pessoas cada vez mais incorporando o espírito de Robinson Crusoé, não em ilhas desertas, mas em Ilhas da Fantasia.